São Paulo, segunda-feira, 11 de dezembro de 1995
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UENF ameaçada de morte

DARCY RIBEIRO

Grave ameaça pesa sobre a sobrevivência da Universidade Estadual do Norte Fluminense. Pesa, por extensão, sobre todas as universidades públicas, porque afeta a sua autonomia com uma nova receita de privatização. A UENF foi criada pela Constituição do Estado do Rio de Janeiro, organizada por leis e decretos e estruturada pelo Conselho Estadual de Educação.
Trata-se de uma universidade em pleno funcionamento, implantada em "campi" próprios, na cidade de Campos, de Macaé e outras da região, com gastos da ordem de US$ 50 milhões em edifícios e equipamentos. Conta já com um corpo de pesquisadores da mais alta qualificação e com um alunado de graduação e pós-graduação que vai se constituindo progressivamente. Vale dizer, com a massa necessária para desenvolver-se autonomamente, se não tiver as asas cortadas pela privatização.
Incumbido de implantá-la, a constituí em dois corpos. Uma fundação mantenedora, encarregada da administração, e a universidade autônoma, no comando de si mesma. Contratei para administrar a fundação uma pessoa escolhida por sua qualificação profissional e pelo respeito que tínhamos pela comunidade acadêmica. Nunca supus que viéssemos a ser vítimas da notória ditadura dos órgãos-meios sobre os órgãos-fins. Isso foi o que sucedeu quando a referida administradora assumiu poder total sobre a UENF. Passou, desde então, a fugir do controle do chanceler, que sou eu, a quem só comunica fatos já ocorridos, bem como do magnífico reitor, a quem trata da mesma forma.
Sua última investida foi contra o governador do Estado, de quem retirou a atribuição de nomear o presidente da Fundação, com mandato de dois anos, fazendo-se um presidente nomeado por ato do Conselho Curador, com mandato de quatro anos, permanentemente renovável, sem qualquer controle seja do Estado, seja da universidade. Passa, ilegalmente, à nova Fundação bens institucionais que eu consegui para a UENF, tais como a Casa da Cultura; o Colégio Jesuítico, onde funcionará a Escola Brasileira de Cinema e Televisão, e o Solar da Baronesa, pertencente à Academia Brasileira de Letras. O golpe mortal contra a universidade está, porém, no contrato de gestão que propõe ao governo, pelo qual a fundação se apropriaria do próprio "campus", seus edifícios e equipamentos, colocando todo o conjunto universitário, inclusive os corpos acadêmicos, sob sua regência.
Trata-se evidentemente de uma manobra de privatização, a primeira de uma universidade pública, que concretizada provocaria grande indignação em todos os professores e estudantes das escolas públicas do país. A referida administradora supõe que obteria maiores recursos privados por doação que os recursos públicos de manutenção e desenvolvimento dados pelo Estado. É uma ilusão. Doações relevantes, nacionais e estrangeiras, são dadas é a órgãos públicos sob a responsabilidade de colegiados socialmente respeitáveis.
A privatização que se pretende, através da nova Fundação e do contrato de gestão, teria como resultado previsível a redução progressiva da qualificação do pessoal docente e dos respectivos salários e, também, o aumento crescente das taxas cobradas aos alunos. Disto resultaria a morte da universidade que concebemos como a Unicamp do Rio de Janeiro, estruturada para ser uma universidade de 3º milênio, voltada para a pesquisa científica e tecnológica e para o desenvolvimento da região.

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