São Paulo, segunda-feira, 11 de dezembro de 1995
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Paciência

MARCELO BERABA

SÃO PAULO - O presidente Fernando Henrique viaja para a Ásia cheio de problemas internos, mas com a reputação e popularidade intocadas. Este parece ser o maior feito do seu governo.
A pesquisa do Datafolha produzida no início do mês é o melhor indicador deste enigma. A maioria absoluta dos paulistanos (exatos 85%) está convencida de que há corrupção no governo. A avaliação de FHC na cidade, no entanto, está ligeiramente melhor agora do que em fevereiro.
E por que as confusões palacianas -escutas telefônicas, questionamentos ao projeto Sivam, pastas cor-de-rosa- não abalam a sua popularidade?
Nem mesmo questionamentos sérios à competência administrativa -como os feitos ao projeto Solidariedade, ao encaminhamento da crise bancária e à ineficiência da Polícia Federal- têm afetado a imagem do presidente.
Para o ministro Sérgio Motta, o segredo estaria na exposição pública das divergências (o que chama de "contradição dialética necessária à criatividade") e no rigor com que o governo estaria tratando os desvios morais e éticos de seus membros.
O ministro tenta, claro, minimizar as crises que se sucedem. Segundo o seu raciocínio, os enfrentamentos, divergências, traições, vazamentos, ameaças e baixarias fazem parte do "processo de um governo democrático".
Mas a verdade é que o pequeno desgaste do governo até este momento se deve menos a esta súbita capacidade que a população teria adquirido de entender que o governo é um "processo" e mais ao fato de que a âncora deste governo é a economia, e não a política.
O grau de tolerância que o país está tendo com FHC só se explica pelo fato de restar a fé nas suas promessas de recuperação econômica.
O controle da inflação e a perspectiva de que mais cedo ou mais tarde a nossa economia (globalizada, modernizada etc) vai explodir e cresceremos como país grande é que provocam esta distinção clara entre o desempenho administrativo e as ações econômicas.
Se um décimo dos escândalos que têm surgido tivesse ocorrido com o Collor, ou mesmo Itamar, a sensação de fim de mundo seria unânime.
Resta saber até quando FHC poderá continuar errando sem que isso reflita nos índices de popularidade. A paciência costuma ter limites e estes surgem sem se fazer anunciar.

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