São Paulo, terça-feira, 12 de dezembro de 1995
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Tucano + poder = pavão

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Alguém deveria engarrafar o ar do poder e vendê-lo. Ficaria rico. E ainda por cima desbancaria o comércio de qualquer outro tipo de droga alucinógena.
Basta ver o comportamento do tucanato, uma vez entronizado no poder. Há um ano essa turma era capaz de pôr no papel a avaliação de que o país vivia a maior crise de sua história republicana (é só consultar os documentos de campanha).
Hoje, passados 11 meses e 11 dias de gestão, tudo parece "céu de brigadeiro", para usar a expressão do tucano mor, o presidente da República. Mortais comuns achariam difícil resolver até uma crise mais simples nesse curto intervalo. Quanto mais a maior crise da pátria.
Para o tucanato, não. Até o caso Sivam, que, diga-se, não fazia parte do elenco de problemas que compunham no ano passado "a maior crise da história republicana", não passa "de tempestade em copo d'água".
FHC exige respeito às palavras das autoridades. Desde que, é lógico, a autoridade seja ele. Se todos, inclusive os tucanos, tivessem respeito à palavra da autoridade quando as autoridades eram os outros (Sarney, Collor etc, para não recuar muito no tempo), a concorrência da Norte-Sul não teria sido suspensa, o Collorgate não teria acontecido, Deus continuaria ajudando João Alves a ganhar na loteria e assim por diante.
Mas agora, por obra e graça do tucanato, tudo mudou tanto que o ministro Sérgio Motta dá-se ao luxo de ensinar lições de vida para os jornalistas, que, segundo ele, deveriam "ter um projeto de felicidade mais adaptado à vida".
Fico imaginando o ministro, toda manhã, barbeando-se diante do espelho e cantarolando uma antiga canção, a que dizia: "O mundo é bom/a felicidade até existe".
Como diriam os franceses, "c'est la vie". "La Vie en Rose" (é uma canção, não uma pasta). Para o poder, claro. E para os outros?
Ah, os outros são apenas uns "amargados", com perdão da expressão em castelhano, mais sonora.
Tão amargos que são incapazes de enxergar até essa maravilha da genética que é o resultado do cruzamento entre tucanos e poder. Dá pavão. Na cabeça. Literalmente.

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