São Paulo, terça-feira, 19 de dezembro de 1995
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Livro traz a arte instigante de Weston

ANA MARIA GUARIGLIA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Foi lançado no mês passado, em Paris, a edição original do diário do fotógrafo norte-americano Edward Weston, relatando as experiências artísticas e fotográficas que o transformaram em um dos mestres da fotografia moderna.
"Journal Mexicain - 1923-1926" foi escrito durante os anos em que viveu no México e é a versão do "Mexican Daybooks", publicado pela primeira vez em 1961, pela historiadora norte-americana Nancy Newhall.
Weston (1889-1958) conta passo a passo a evolução das teorias que o levaram à idealização da imagem absoluta, obtendo como resultado a fotografia na sua forma estética mais pura e com as qualidades da imagem original.
Ele não teria chegado a esses conhecimentos se tivesse permanecido como um retratista convencional em seu estúdio de Glendale, em Los Angeles.
Instigado pelas novas idéias dos meios artísticos californianos e pelas obras modernistas da "Camera Work", série de revistas editadas pelo alemão Alfred Stieglitz, Weston decidiu ir para o México.
Na década de 20, o país vivia uma efervescência cultural, liderada por pintores como Clemente Orozco e Diego Rivera, que se tornou grande amigo de Weston.
Visualizando novas perspectivas para seu trabalho, o artista deixou a mulher Flora e os 4 filhos. Abandonou o estúdio, a sociedade com a antiga amante Margrethe Mather e as ligações com o bailarino homossexual Ramiel McGhee.
A imigrante italiana Tina Modotti, sua amante desde 1921 e que também o influenciou a viajar, foi sua companheira durante a época em que morou no México.
Figurante de filmes em Hollywood, aluna de Weston e ativista política, Modotti (1896-1942) tornou-se sua musa e modelo no estúdio instalado na capital mexicana.
Seus nus escandalosos são considerados os mais expressivos do fotógrafo e deram a ela a oportunidade de posar para os pintores Rivera e Alfaro Siqueiros.
Apesar da vida agitada na comunidade social e artística mexicana, Weston mantinha suas experiências fotográficas em uma rotina disciplinada.
"Depois de uma noite de insônia, me vejo novamente em meu escritório, mais obstinado do que nunca, engalfinhando-me ferozmente com este negativo, como se fosse um trabalho de Hércules", escreve o fotógrafo em seu diário.
Em outro trecho anuncia: "Sei que me dedico demais para um público pouco interessado, mas sei também que a visão mais exigente da fotografia é o realismo".
Weston registrou os camponeses e as paisagens mexicanas com a mesma paixão com que idealizou os nus de Modotti. Os padrões tonais de sombra e luz, a textura e a essência dos motivos eram valorizados em toda a sua extensão.
O perfeccionismo técnico se reflete na projeção da beleza, extravasada através da visão instigante e sensual das formas que esculpia.
Não é por acaso que, ainda hoje, sua obra é fonte de inspiração para milhares de seguidores e adeptos de sua fotografia.
A época frutuosa do México terminou em novembro de 1926. As divergências políticas e o relacionamento tumultuado entre Weston e Modotti fizeram com que ele a deixasse definitivamente. De volta aos EUA, continuou sua obra.
Dedicando-se à fotografia e às causas operárias, Modotti manteve correspondência com o artista até a década de 30. Em 1942, morreu misteriosamente dentro de um táxi, na cidade do México.
O diário de Weston não é exatamente um livro técnico, mas um relato humano, pontilhado de confissões sentimentais. Privado de suas bases culturais e afastado dos filhos e dos amigos, reproduz suas preocupações e inseguranças e as povoa com reflexões intimistas.
A edição francesa não traz fotos ou ilustrações. Nem seria necessário. A descrição que Weston faz das suas imagens é tão perfeita como aquelas copiadas no papel.

Livro: Journal Mexicain - 1923-1926
Autor: Edward Weston
Páginas: 297
Preço: R$ 48,10
Onde encomendar: Livraria Francesa (tel. 011/231-4555)

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