São Paulo, sexta-feira, 29 de dezembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ano velho, ano novo

JOSÉ SARNEY

Meu avô, Assuero Ferreira, paraibano do Ingá do Bacamarte, localidade que só perdia em matar gente para o Catolé do Rocha, morreu com 96 anos; homem de trabalhar a terra, retirante da seca para o Maranhão, gostava de falar por provérbios. Um deles era: "Comigo não tem esse negócio de ano novo e ano velho, ano é do meu nascimento".
O tempo, Einstein à parte, é uma invenção do homem. Nós o fazemos por um sistema de referências, e é bom que assim tenha sido.
O ano de 1995 foi marcado pela capacidade do Brasil de alcançar um nível de governabilidade que assegurou a estabilidade necessária ao governo para tomar decisões. Creditemos o bom desempenho da economia ao carro-chefe de uma inflação baixa.
Por outro lado, malgrado o ruído que causam internamente as viagens presidenciais, o Brasil ampliou seus espaços internacionais e retoma prestígio. Hoje, ninguém pode viver isolado, e o país não pode dar-se ao luxo de descuidar da política externa. Ela é um componente fundamental da política interna.
Debite-se, como negativas a 95, a política de juros e do câmbio, armadilhas que estão aí, responsáveis pela estagnação e que transferem seus fluidos para 96, bem como o enfraquecimento do princípio federativo.
Mas em economia a conta dos anos faz-se a cada dia, os 12 meses anteriores, e esses, a 31 de dezembro, dão para fechar com razoável resultado.
Em nosso bom e velho calendário gregoriano, deveremos mudar de ano proximamente.
O Congresso deu uma inestimável contribuição para a governabilidade, o que reflete grande maturidade da classe política, governabilidade essa decorrente de um pacto tácito em torno da modernização do país e da retomada do desenvolvimento.
Recobrou sua dignidade, reafirmando o seu papel primordial no fortalecimento do processo democrático.
Não acredito que, politicamente, tenha grandes mudanças em 1996. Há um firme desejo do Congresso em sustentar as reformas e o Congresso voltou a ser o centro do debate político e apresentou bom desempenho, melhorando seus trabalhos quer quantitativamente, quer qualitativamente.
Quando se lida com realidades complexas há que ter prudência e não arriscar palpites. Os cenários do futuro só devem ser construídos como tendências, e com as necessárias ressalvas. Tendencialmente reunimos muitas condições para melhorarmos.
Com inflação controlada, e retomado o ritmo de crescimento, torna-se urgente uma mais justa redistribuição de renda, o combate à pobreza, a fim de diminuirmos as desigualdades sociais.
É necessário e urgente também a redução das disparidades regionais, por meio do fortalecimento da federação e de uma "economia espacial" adequada ao nosso país. Em outras palavras, e resumindo, torna-se premente uma reforma estrutural que coloque o Brasil à altura de seu destino.
No que concerne ao ano que passou, o balanço é bom. 1995, mesmo com algumas ventanias, não teve furacão. E 1996 não aponta nada que possa mudar esses bons prognósticos. Mas tomo a minha vacina, dizendo que se não é preciso acertar, não se pode errar, e toda atenção é necessária à boa condução política.

Texto Anterior: A arte do século
Próximo Texto: Biombo tolo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.