São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
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PT completa 15 anos sem definir seu perfil

AMÉRICO MARTINS; EMANUEL NERI
DA REPORTAGEM LOCAL

O Partido dos Trabalhadores (PT) completa no próximo dia 10 seu 15º aniversário ainda tentando definir seu perfil e a imagem que pretende fixar junto ao eleitorado.
O PT é o resultado da mistura de integrantes do novo sindicalismo surgido no ABC paulista —liderado por Luiz Inácio Lula da Silva— com intelectuais, militantes esquerdistas e católicos que buscavam um novo instrumento de atuação política para se opor ao regime militar, lutar pela redemocratização e criar as "condições objetivas" para a implantação de um regime socialista.
Em 15 anos, essa tentativa de combinar genes de diferentes origens não produziu uma organização estável e de caráter definido. Após tanto tempo, o partido ainda não conseguiu estabelecer o modelo de socialismo que propõe —mesmo porque hoje possui alas que não mais defendem o socialismo.
Sua trajetória não é, porém, apenas uma sucessão de conflitos internos e hesitações. De 1982 para cá, a bancada federal cresceu ininterruptamente, e hoje o PT é um dos maiores partidos do Congresso. Ficou em segundo lugar na disputa pela Presidência em 1989 e 1994. Hoje, os petistas governam o Distrito Federal e o Espírito Santo.
As vitórias eleitorais foram acompanhadas por profundas mudanças políticas. O PT nasceu com discurso radical: "O Partido dos Trabalhadores é um partido sem patrões", dizia o anteprojeto do partido. Hoje, porém, o PT incorporou uma parcela do empresariado aos seus quadros, como revela o levantamento do cientista político Benedito Tadeu César. Essa transformação se manifesta até nos detalhes de comportamento: Lula passou a fumar charutos, e Gilmar Carneiro (líder dos bancários) decidiu tirar a barba.
A evolução do partido vem se efetivando através de uma intensa luta interna, que já resultou na expulsão de alguns grupos de extrema-esquerda —como a "Convergência Socialista" e a "Causa Operária". O grupo de Lula, a "Articulação", sofreu um racha nos últimos anos —enfraquecendo sua liderança. Reside aí, talvez, uma das razões do alheamento do principal líder petista em relação aos conflitos entre as diversas tendências.
A campanha para a Presidência da República em 1994 foi acompanhada por uma trégua entre as diversas alas do partido, diante da expectativa generalizada de que Lula venceria a eleição. Após a derrota, os antagonismos reprimidos voltaram à tona rapidamente.
Lula tenta agora rearticular seu antigo grupo e reduzir o espaço ocupado pelas tendências de extrema-esquerda. O resultado dessas disputas é incerto. Se ninguém era capaz de prever a evolução do partido em 1980, hoje tampouco parece possível definir o perfil que vai assumir a partir de agora.

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