São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
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Militância petista é formada por elite

EMANUEL NERI; AMÉRICO MARTINS
DA REPORTAGEM LOCAL

Militância do PT é formada por elite
Pesquisa revela que nível de renda e escolaridade dos petistas é superior à media da população brasileira
Aos 15 anos, o PT é um partido formado por uma elite. Seus militantes têm um perfil eminentemente urbano. Em sua maioria, são brancos, do sexo masculino e com nível de renda e de escolaridade superior à média dos brasileiros. A base petista vive nas regiões mais ricas do país.
Os petistas definem a democracia como base da organização política da sociedade. Para seus militantes, cuja grande maioria tem no PT sua primeira experiência político-partidária, o partido é socialista e democrático.
O mais completo perfil dos petistas já divulgado no país faz parte da tese de doutorado do cientista político Benedito Tadeu Cesar, 41, na Unicamp (Universidade de Campinas). A Folha teve acesso exclusivo a esse trabalho.
Desde 1991, César estuda o perfil dos petistas presentes nos diversos congressos do partido. Através de pesquisas feitas em eleições entre 1982 e 1990, ele também elaborou o perfil do eleitorado do PT.
Essas características do partido, reveladas pelo estudo, é um dos fatores que dificultam o relacionamento da legenda com os setores desorganizados da sociedade.
O deputado federal José Genoino (SP), representante da chamada "direita" do PT, por exemplo, considera que a falta de diálogo com os setores desorganizados é o grande problema do partido.
"O PT não conseguiu resolver o problema de ser um partido democrático e de massa", diz. Ele defende que os filiados tenham mais poder interno para que a "base social" da legenda participe de fato da vida partidária.
O secretário-geral do PT, Gilberto Carvalho - da tendência "Unidade e Luta" - reconhece e ssa "fragilidade" da legenda, mas também enxerga uma "virtude" no enraizamento petista entre os setores mais organizados da sociedade. Segundo ele, foi isso que permitiu um avanço institucional da legenda.
As tendências mais à esquerda tendem a criticar os resultados da pesquisa. Walter Pomar, da ala esquerda da "Hora da Verdade", e Markus Sokol, de "O Trabalho", reconhecem que boa parte dos petistas têm condições de vida melhores do que a média da sociedade, mas duvidam dos resultados obtidos por Tadeu César.
Pomar acha que a pesquisa teria uma efeito maior se comparasse o militante petista com "a militância ativa do PSDB".
Sokol prefere dizer que existem outros culpados pela elitização petista, como, por exemplo, os parlamentares do próprio partido.
A esquerda costuma identificar Tadeu César como um simpatizante das tendências mais moderadas do PT. Essa desconfiança surge do fato de o cientista político ter sido o coordenador da campanha de Vítor Buaiz à Prefeitura de Vitória, em 85.
Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ele próprio é um militante petista. Sua pesquisa é uma tese que ainda não foi defendida.
A análise do próprio César é a de que o perfil dos militantes revela que o partido é "moderno", mas que ele tem "oscilado" entre "o paradigma revolucionário clássico" e um "novo paradigma, baseado no reconhecimento da democracia como valor permanente".
O seu trabalho não se propõe a resolver esta questão, mas ele analisa que, com base nos resultados, fica claro que os militantes negam tanto as concepções socialistas tradicionais como as formas capitalistas, sem conseguir substituí-las. Dos 523 mil filiados até 1991, 52% residiam no Sudeste, a região mais rica do país. No Nordeste, moram 16,9% dos petistas, contra 14,8% no Sul e 9,5% no Norte.
Há entre os petistas um predomínio acentuado da presença masculina sobre a feminina. A participação dos homens no interior do partido chega a atingir 75,2%, contra 24,3% de mulheres.
Essa diferença é significativa quando se constata que a população feminina do país é superior à masculina. A superioridade branca no PT é outro dado a ser destacado quando comparada aos filiados negros —9,2% contra 65,8% brancos. Mas a desigualdade diminui quando confrontada com a população.
Segundo o IBGE, a população branca do país é de 55,8%. Os petistas negros superam os 5,1% da população negra. Os considerados pardos correspondem a 21,1% dos militantes, enquanto, entre os brasileiros, essa taxa atinge 38,6%.
Para os padrões do Brasil, o nível de escolaridade dos petistas é bastante alto. É de apenas 1% o índice de filiados sem instrução —que nunca foi à escola ou a frequentou por menos de um ano—, contra 18,7% da população.

Na Universidade
O PT tem 58,6% de seus filiados com nível universitário ou mais (mestrado, doutorado) contra apenas 5,5% da população brasileira. Existem 7,2% com mestrado e 1,6% com doutorado.
A maioria dos dirigentes e militantes também tem salário superior à média dos trabalhadores do país. Apenas 2,9% da base do partido ganha até um salário mínimo, contra 24,2% da população.
A maior parte dos petistas (26,2%) ganha salários que vão de mais de cinco a dez salários mínimos, mais que o dobro dos brasileiros (11,4%). Há 14,9% dos "barbudinhos" que ganham de dez a 20 salários e 6,2% com mais de 20 salários.
Os eleitores petistas também têm elevado nível de escolaridade e de renda e estão concentrados nas regiões Sudeste e Sul.
Baseada em resultados de eleições realizadas entre 1982 e 1990, a pesquisa do cientista político Benedito Tadeu Cesar conclui que o desempenho petista melhora à medida que sobe o nível de renda e de instrução do eleitor.
Em São Paulo, berço do PT, o partido obteve cerca de 13% dos votos do eleitorado com primeiro e segundo graus e curso superior na eleição de 1982. Nos eleitores com o primeiro grau incompleto, seu desempenho chegou a apenas 8,6%. Quanto à renda, o crescimento também é significativo. Na eleição para o governo de São Paulo de 1986, o PT obteve apenas 4,1% dos votos dos eleitores que ganhavam até dois mínimos.
Na faixa de renda de dois a cinco salários, o PT paulista dobrou sua votação - 10,9% dos votos - e cresceu mais ainda entre os eleitores que ganhavam acima de cinco mínimos - 11,4% da preferência. Essas tendências se verificaram também em outros Estados.
(Emanuel Neri e Américo Martins)

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