São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
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Governo não garante direitos constitucionais dos deficientes

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Seis anos depois de promulgada a Constituição, os direitos e garantias das pessoas portadoras de deficiência continuam não sendo respeitados. As desculpas para este quadro vão desde a clássica "falta de verbas" até à não menos conhecida "falta de regulamentação dos dispositivos constitucionais".
A Constituição diz, por exemplo, que é um dever do Estado garantir "atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino".
Apesar deste preceito, no dia 5 de janeiro último o governador de São Paulo, Mário Covas, vetou integralmente o projeto de lei nº 6.693, que instituía um programa de educação especial para os deficientes no Estado. O motivo alegado foi que tal programa oneraria demais os cofres estaduais.
Segundo estatísticas da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 10% da população brasileira tem algum tipo de deficiência (física, mental ou sensorial). Isso dá cerca de 15 milhões de pessoas, ou uma vez e meia a população de Portugal.
"Estas pessoas são marginalizadas pela sociedade, que desconhece seu potencial intelectual e de trabalho. A Autolatina já percebeu que os surdos são muito eficientes no trabalho de digitação, e emprega vários deficientes auditivos em seu serviço de digitação. Eles são menos dispersivos", conta Lafaiete Pussoli, consultor da Organização Internacional do Trabalho em legislação sobre deficientes.
A Constituição determina que as ruas, os edifícios públicos e os veículos de transporte coletivo sejam adaptados para garantir o acesso adequado dos deficientes.
"Os prédios públicos continuam sendo construídos sem os devidos acessos para deficientes. Os telefones públicos, por exemplo, são instalados em cabines onde não entram cadeiras de rodas ou em orelhões nos quais os cegos vivem dando cabeçadas", lembra Luiz Alberto David Araújo, procurador da República em São Paulo.
A Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Corde), órgão federal que estuda o problema, enviou aos novos governos federal e estaduais subsídios para melhorar a situação dos portadores de deficiência.
Na área da educação, o Corde propõe a destinação de 5% do Orçamento da Educação, com um aumento progressivo até o final da década de modo a atingir 10%, para a educação especial.
Um dispositivo constitucional que até hoje não é cumprido (sob a alegação de que não foi regulamentado por lei) é o pagamento de um salário mínimo mensal para o deficiente que não pode manter-se ou cuja família não pode sustentá-lo. O Corde propõe a sua regulamentação e implementação.
"A não regulamentação desse dispositivo até hoje escuda-se também no argumento de que a seguridade social não tem dinheiro para enfrentar mais essa despesa. Mas o Estado não pode eximir-se de cumprir suas obrigações, principalmente quando elas são garantias dos cidadãos consagradas na Constituição", diz Pussoli.
Em 1993, o Tribunal Regional Federal de São Paulo mandou o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) pagar um salário mínimo mensal para uma tetraplégica. Ela havia sofrido um acidente no qual perdera toda a família. Pela decisão, a concessão do benefício não depende de regulamentação.

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