São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
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DO CICLO "VENEZA" - III

1909
DO CICLO "VENEZA" - III

O barulho da vida já não dura.
A maré de inquietudes se quebranta.
E no veludo negro o vento canta
Minha vida futura.

Talvez despertarei noutro lugar,
Quem sabe nesta terra entristecida,
E algumas vezes hei de suspirar
Pensando em sonho nesta vida?

Mercador, padre, arrais, neto de um doge,
Quem me fará viver? Que criatura
Há de forjar com minha mãe futura
Na noite escura a vida que me foge?

Quem sabe até, ao escutar o canto
O meu futuro pai por entre o encanto

Quem sabe em algum século vindouro
A mim, criança, a sorte me consente
Abrir as pálpebras, tremulamente,
Junto à coluna do leão de ouro?

Mãe, o que canta este áfono instrumento?
Talvez a fantasia já te embale
E me protejas com teu santo xale

Não! O que é, o que foi —tudo está vivo!
Fantasias, visões, idéias —tudo!
A onda do oceano recidivo
As despeja na noite de veludo!

ALEKSANDR BLOK

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