São Paulo, quinta-feira, 23 de fevereiro de 1995
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Crime e euforia

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA — Dezembro do ano passado foi o pico da euforia nacional: lojas abarrotadas, consumo desenfreado em meio a preços em queda. Nesse período foram assassinadas 15 pessoas a cada 24 horas apenas na cidade de São Paulo —ou seja, quase uma chacina de Vigário Geral e o dobro de uma Candelária por dia. A má notícia, porém, não está exatamente aí.
Liberados agora pela Prefeitura de São Paulo, os números mostram que a violência urbana se dissemina na cidade mais rica do Brasil, servindo de espelho para o resto do país. E mostra que os efeitos do real ainda não se prestaram a reduzir a criminalidade.
Nunca São Paulo teve tantos assassinatos num único mês. Mais: comparando-se 12 meses, vemos que a matança cresceu devastadores 15% em relação ao ano anterior. Note-se que as estatísticas só levam em conta as vítimas que moram e foram mortas no município.
A maioria das vítimas (75%) tem entre 20 a 49 anos. Quase todos homens: 93,3%. A cidade serviu de cenário, em 1994, para o assassinato de 571 crianças e adolescentes, o que dá 1,5 por dia.
Esses números costumam provocar histeria: apoio a medidas duras e até extermínio. Além da histeria, abundam as soluções simplórias. Óbvio que é imprescindível melhorar o policiamento, óbvio que as prisões devem ajudar a recuperar o preso e não massacrá-lo ainda mais, óbvio que o país necessita crescer e distribuir renda, óbvio que as autoridades devem se esforçar em manter as crianças na escola.
Há uma operação indispensável, mas esquecida: educação contra a violência. Ou seja, ensinar as pessoas a resolver conflitos sem usar a força. Toneladas de estudos mostram que a vítima de agressão tende a virar agressor —é um dos efeitos perversos da violência doméstica. A violência torna-se, em essência, uma linguagem, um meio de se comunicar.
As escolas e seus professores não sabem lidar com o problema. Muito menos os meios de comunicação: basta ver como as televisões bombardeiam diariamente as crianças e adolescentes com cenas de violência.

PS — Já que Sérgio Motta se esforça tanto em inovar no Ministério das Comunicações, ele prestaria um bom serviço se ajudasse a disciplinar a violência nos meios de comunicação.

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