São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
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O Ministério Público e as contribuições sindicais

FRANCISCO CALASANS LACERDA

Embora a Constituição Federal proíba expressamente ao Poder Público em seu art. 8º, I, a interferência e a intervenção na organização sindical, o Ministério Público do Trabalho, dando interpretação bastante elástica aos arts. 127 e 129 III, vem incluindo entre suas prerrogativas acionar sindicatos que atribuem a seus representados qualquer tipo de contribuição, fazendo-o com base na Lei complementar 75/93.
Apegam-se os doutos representantes do MPT às expressões: "interesses sociais e individuais indisponíveis (CF. Art. 127); "...outros interesses difusos e coletivos" (CF, art. 129, III) e, por último, "...liberdades individuais indisponíveis dos trabalhadores", (LC 75/93).
Ocorre que atribuir contribuições à categoria profissional representada sempre foi uma das prerrogativas legais dos sindicatos, desde o art. 513, e), da CLT e essa prerrogativa é mantida pela Carta Magna, a teor do Inciso IV, do mesmo art. 8º, aonde se lê: "a assembléia fixará a contribuição...", sendo certo, ainda, que os direitos e interesses individuais ou coletivos específicos da categoria profissional é outra prerrogativa do sindicato expressa no Inciso III, do mesmo dispositivo constitucional que reza: "ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas".
Ora, a forma democrática de se colher a vontade da categoria profissional é a assembléia geral. Nela se discute, por exemplo, a necessidade de o sindicato manter a assistência médica e odontológica além da jurídica, enquanto o Estado não cumpra o seu dever de fazê-lo, para com isso evitar-se aquela fila humilhante e insuportável em frente aos postos do INPS.
Em face dessa realidade perversa agravada pela política criminosa de achatamento salarial de há muito implantada no país, os trabalhadores decidem pela aprovação de contribuições extraordinárias porque sabem que aquela contribuição equivalente a um dia de trabalho (CLT, art. 578) somente seria suficiente se o poder aquisitivo dos salários fosse real.
Eles sabem o que estão fazendo e essa é a razão pela qual não cabe a interferência paternalista do Ministério Público, sob pena de se estar admitindo a negação de princípios fundamentais contidos a partir do art. 1º da Lei Maior.
O MP não pode nem deve contrariar as decisões de assembléias gerais exatamente porque a soberania da assembléia sindical se constitui, em se tratando de regime democrático, no principal dentre aqueles "interesses sociais e individuais indisponíveis" a que ele próprio está obrigado a defender, a teor do art. 127 da Carta Federal.
Com base na soberania da assembléia a diretoria do sindicato contrata funcionários e assume compromissos que não podem ficar a mercê do MP à semelhança do que ocorria antes de 45 de outubro de 1988, quando o Ministério do Trabalho intervinha nos sindicatos. Afinal, os trabalhadores sofrem outro tipo de desconto de seus salários, com os quais jamais concordaram que é o imposto de renda. Como toda a sociedade sabe que salário não é renda, eis aí uma boa tarefa para os doutos representantes do Ministério Público do Trabalho.

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