São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
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Tequila, saquê, gim...

ANTONIO KANDIR

Para quem imaginou que 1995 passaria em águas mornas e tranquilas, este início do ano reservou surpresas, umas previsíveis, outras espantosas. Das mais importantes, vale a pena fazer uma pequena lista.
Primeiro, ainda ao final de 94, veio a crise cambial mexicana, precipitada de forma aguda, abalando a credibilidade dos mercados emergentes.
Depois, o terremoto no Japão, que mexeu com o mercado por afetar as disponibilidades financeiras de grandes fundos de investimento daquele país, agora a braços com a necessidade de reconstruir cidades inteiras.
Por fim, a quebra do Barings & Brothers, terceiro maior banco do país-símbolo da ortodoxia financeira, levado à falência por maluquices especulativas no mercado de derivativos.
Frente à onda de instabilidade desencadeada, duas perguntas interessam diretamente ao Brasil: 1) em que posição nos apanha essa onda que não parece de curta duração? 2) o que fazer para minimizar os efeitos internos da instabilidade internacional?
A instabilidade internacional nos alcança num momento decisivo do processo de combate à inflação e retomada do desenvolvimento em bases firmes. Já vencemos com imenso sucesso a parte inicial desse processo. A inflação mantém-se abaixo de 2,5% desde setembro de 1994, a economia cresceu 7,6% no segundo semestre de 94 e continuará a crescer, os investimentos alcançaram os 20% do PIB, maior percentual da década, e as contas públicas, ainda que não em bases duradouras, estão sob controle.
Não é segredo para ninguém, entretanto, que a sustentação de longo prazo dessa trajetória ainda não está assegurada. Para assegurá-la, há um objetivo essencial a ser cumprido.
Trata-se do aumento da poupança doméstica, pública e privada. A recuperação da poupança pública, historicamente responsável pela sustentação do investimento no Brasil, depende das reformas constitucionais, de modo especial nas áreas fiscal e da Previdência.
Já a elevação da poupança privada requer, além de crescimento da renda, coisa que só o crescimento pode produzir, mudanças institucionais que estão ao alcance das forças políticas propor e realizar. Nessa perspectiva, deve-se levar na devida conta o aspecto "segurança", como um dos estímulos importantes ao aumento da poupança privada. E sob esse aspecto a instabilidade internacional, que realça os riscos de uma desregulamentação financeira tresloucada, coloca desafios novos.
Para aumentar a segurança, duas linhas de ação interligadas me parecem oportunas e importantes. Uma delas, em que a capacidade de intervenção do Brasil é mais limitada, consiste em empenhar-se pela criação de mecanismos supranacionais que reduzam os riscos de movimentos especulativos altamente destrutivos, conforme já sugerido pelo presidente Fernando Henrique.
A outra, voltada para o plano interno, consiste em aperfeiçoar mecanismos e instituições incumbidas de zelar pela segurança do sistema financeiro e de seus participantes, em vários segmentos.
No plano interno, velhos problemas (má gestão de bancos públicos, acúmulo de funções pelo Banco Central, desaparelhamento da CVM etc.) são acrescidos ou potenciados por novos problemas colocados pela globalização dos mercados financeiros.
Graças à boa condução da política econômica nos últimos tempos e ao vigor da economia brasileira, não vivemos a contingência dramática, como outros países, de reformar o edifício em pleno terremoto.
É claríssimo, no entanto, que a questão da reforma do sistema financeiro está, mais do que nunca, na ordem-do-dia. Sendo de sua esfera de competência, o Congresso Nacional precisa estar preparado para assumir postura ativa na discussão dessa matéria.

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