São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
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TRECHO

EXTRAÍDO DE A MECÂNICA DAS ÁGUAS

Num certo sentido, foi lamentável eu ter me envolvido pessoalmente no que chamarei, por ora, de caso Pemberton. Do ponto de vista profissional, deve-se chegar tão perto da coisa quanto possível, mas jamais a ponto de envolver-se com ela. Se o jornalismo fosse uma filosofia e não um ofício, uma de suas premissas seria a de que não há ordem no universo, nenhum sentido discernível, sem... o jornal diário. Assim, nossa ingrata tarefa de moldar o caos em frases dispostas em colunas é, na verdade, um imperativo monumental. Para podermos ver as coisas tais como são e fazer o que temos que fazer dentro dos prazos previstos, é melhor evitar qualquer envolvimento.
O "Telegram" era um vespertino. Por volta das duas ou duas e meia da tarde fechávamos a edição. Às quatro a impressão já estava terminada. Às cinco eu ia ao bar do Callaghan, logo depois da esquina, encostava no balcão de carvalho com meu caneco de cerveja e comprava, do menino que entrava no bar vendendo jornais, um exemplar. Meu maior prazer... ler meu próprio jornal como se não fosse eu que o tivesse produzido. Evocar em mim mesmo os sentimentos de um leitor comum sendo informado das notícias, as notícias que eu construíra, como se fosse a criação "a priori" de um poder mais elevado —a coisa-em-si objetiva, impressa com tipos fundidos no céu.

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