São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
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Melhor que o nhenhenhém

CLÓVIS ROSSI

COPENHAGUE — "Todo ser humano tem direito a um nível de vida adequado, que lhe assegure, assim como à sua família, a saúde e o bem-estar e, em especial, a alimentação, o vestuário e a moradia".
É o que diz o artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, velha de meio século.
Não é preciso esfalfar-se compilando estatísticas para desconfiar que se trata de uma belíssima mas vazia retórica.
Por quê diabos, então, as Nações Unidas promovem, a partir de amanhã, em Copenhague, a Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Social? Para rechear mais um maço de folhas de papel com outro tanto de retórica inútil?
Embarquei para Copenhague com essa pergunta na cabeça e mais meu invencível ceticismo. Até ler, no avião, o relatório "Situação Mundial da Infância - 1995", preparado pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
O documento faz um balanço de uma cúpula parecida com esta de Copenhague, o Encontro Mundial de Cúpula pela Criança, realizado em 1990. Estabeleceram-se, nele, metas específicas para melhorar as condições de vida das crianças. E o que aconteceu de lá para cá?
"Mais de 100 países em desenvolvimento, que abrigam mais de 90% das crianças de todo o mundo em desenvolvimento, estão realizando progressos significativos em direção às metas", responde o Unicef.
E completa: "Esses progressos significam que o número de mortes infantis em 1996 será reduzido em 2,5 milhões com relação a 1990. Significa também que dezenas de milhões de crianças serão poupadas da armadilha traiçoeira da desnutrição, que prejudica seu desenvolvimento".
Agora, governantes de praticamente todo o mundo fixarão metas para erradicar a pobreza, chegar a uma situação de pleno emprego e promover a integração social.
Na prática, interessa menos o papel que vão assinar, em si, e mais o fato de que, ao fazê-lo, abre-se o caminho para as cobranças da sociedade. Convenhamos que é melhor que o nhenhenhém, não?

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