São Paulo, domingo, 19 de março de 1995
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Capital volátil é "droga", diz professor de Harvard

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Países como o Brasil, México e Argentina que utilizam o chamado "dinheiro volátil" dos investidores internacionais são como "viciados em drogas que, uma vez presos ao vício, podem acabar morrendo repentinamente".
A comparação é de George C. Lodge, acadêmico da Universidade de Harvard e um dos maiores especialistas dos EUA em globalização e mercados internacionais.
Em entrevista à Folha, Lodge afirmou que a atuação das corretoras internacionais nos mercados de países considerados emergentes é um "zoológico cheio de bichos selvagens".
"Estes garotos de Wall Street podem acabar com um país de uma hora para a outra", diz. "É uma situação ridícula onde países como o México e o Brasil ficam nas mãos de um grupo de pessoas ávidas por ganhar dinheiro".
Lodge, que também já foi presidente da Organização Internacional do Trabalho (OIT), diz que o Brasil deveria fazer "todo o esforço" possível para deixar de ser dependente de "qualquer centavo" desses "garotos" —muitos dos quais, diz, são seus ex-alunos.
Na sua opinião, a responsabilidade pelo controle desse mercado deveria ser do FMI. "Mas, infelizmente, o FMI só tem atuado nos últimos anos como uma serra, mandando os países cortarem isso e aquilo, sem uma orientação global para o mercado internacional", diz. "Esta atitude pode matar todo o sistema".
Ele afirma que o problema está concentrado exclusivamente nas corretoras que atuam no mercado internacional. "Os bancos já têm tanto dinheiro nestes países que não pensam em arruiná-los com movimentos como estes", diz.
Durante os anos 80, países como Brasil, Argentina e México endividaram-se para sustentar suas economias com dinheiro emprestado de bancos —os "petrodólares". "Nos anos 90, isso é muito diferente. O dinheiro que entra agora ferve na mão dos especuladores", diz.
"Se a situação no México, no Brasil ou na Argentina aparenta fragilidade, eles não pensam um segundo sequer para tirar o dinheiro desses países".
"Com os velhos banqueiros como David Rockfeler a situação era diferente. Eles tinham pontos de vista diferentes. Mas estes rapazes com seus computadores não querem saber de nada, só pensam em ganhar dinheiro fácil".
Na semana passada, Stephen Baine, presidente da corretora First Chicago Investment Company, estava no Brasil "em visita exploratória". Ele comanda uma "montanha" de US$ 25 bilhões e pretendia trazer uma pequena parte para o Brasil.
O investidor afirma que "infelizmente" as corretoras têm agido por "instinto" nos últimos anos, causando alguns estragos quando fazem "movimentos rápidos".
"Elas se deixaram levar pela idéia de que toda a América Latina era a mesma coisa. Quando a coisa ficou ruim no México, a tendência foi vender tudo o que tinham em toda a região, sem considerar as peculiaridades", avalia.
"Infelizmente, este comportamento também fez alguns estragos no Brasil e na Argentina".

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