São Paulo, domingo, 19 de março de 1995
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Dólar declina no mercado global

Moeda que se impôs no Pós-Guerra recua nas reservas mundiais

DA REPORTAGEM LOCAL

Moeda global que surgiu antes de um mundo globalizado, a supremacia do dólar não corresponde inteiramente às relações econômicas entre as potências que ajudou a reerguer no pós-Guerra.
Em 1975, as reservas mundias abarcavam 6,3% de marcos, 79,8% de dólares e 0,5% de iens. Quase 20 anos depois, a preferência pelo marco para 16,1%, a do ien para 9%. O dólar perdeu espaço —61,4%.
Economistas japoneses calculam que o câmbio ideal deveria estar entre 110 e 115 ienes por dólar e concordam também que isto não ocorrerá este ano.
Economistas americanos calculam que o dólar caiu excessivamente. Acertar sua cotação real é uma aposta que os investidores do mundo inteiro já estão procurando calibrar e que fatalmente irá gerar novas ondas de acomodação no mercado global.
Quando o dólar batia recordes históricos de baixa no início do mês, perguntaram ao presidente dos EUA, Bill Clinton, o que iria acontecer com a moeda americana. "Uma das coisas que aprendi desde que estou aqui é que qualquer coisa que eu diga a este respeito está errada", respondeu, diante das câmaras de TV.
Quando Clinton assumiu o cargo mais importante do mundo, um dólar era trocado por 120 ienes japoneses. Hoje, caiu abaixo dos 90. Os efeitos foram considerados desastrosos do outro lado do mundo.
"Se o câmbio continuar neste nível haverá sérios problemas para toda a estrutura industrial japonesa", reclamava Hiroshi Okuda, vice-presidente da Toyota, maior fabricante de veículos do país.
Máquina exportadora capaz de produzir superávits de US$ 50 bilhões apenas com os EUA, na compra e venda de mercadorias, o Japão perde com a queda do dólar porque seus produtos ficaram bem mais caros. A cada 10% a mais no ien, o Produto Nacional Bruto japonês cai 0,5%.
Abalados pelo terremoto do dólar, presidentes dos dez maiores Bancos Centrais do mundo se reuniram na Basilea, na Suíça, no dia 13 de março. Ali, Hans Tiemeyer, presidente do BC alemão, o segundo mais importante da hierarquia das decisões monetárias mundiais, fez coro com os japoneses.
"É importante que os países enfrentem seus problemas fundamentais de forma crível e neste momento se coloca a questão do que pode fazer a política monetária", disse. A Alemanha, pelos mesmos motivos que o Japão, perde com um dólar fraco.
O recado era para os Estados Unidos. Os americanos continuam inundando o mundo de dólares, entre outros motivos porque são os únicos que têm a capacidade de imprimí-los. O déficit do governo dos EUA pulou de 27,2% (em 1980) para 52% de seu Produto Interno Bruto —um abismo de US$ 3,1 trilhões.
Esta dívida vira moeda de um lado e títulos do Tesouro de outro. E, no rastro da globalização, ocorreu uma mudança estrutural, segundo os economistas do Fundo Monetário Internacional: "O aumento da porcentagem da dívida pública nacional em mãos de estrangeiros".
Cerca de 20% da dívida dos sete maiores países industriais estava em mãos de não-residentes. Os títulos americanos, denominados em dólar, compõem a carteira de investimentos negociados nos principais mercados mundiais, o que torna a fixação dos juros nos EUA e a variação do dólar preocupações mundiais.
Outra torneira de dólares crônica é o déficit da balança comercial —os EUA compraram US$ 155 bilhões mais do que venderam a outros países em 1994. Esta situação não é nova. Norte-americanos reconstruíram a Europa e o Japão após a Guerra, sustentaram com seus déficits e emissões de dinheiro os pesados investimentos para impedir o avanço do comunismo. Fizeram do dólar a moeda de reserva do planeta.
E fizeram dos governos dos países desenvolvidos reféns do dólar. Há US$ 1,1 trilhão deles nos Bancos Centrais de quatro continentes. E para sustentar ataques contra suas divisas —evitar que elas percam na concorrência pela venda de produtos— frequentemente estes BCs têm de adquirí-los em larga escala.

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