São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Brasil teme acordo sobre efeito estufa

DANIELA CHIARETTI
GERENTE DO BANCO DE DADOS

A delegação brasileira que estará amanhã, na Alemanha, participando das discussões em torno da Convenção sobre Mudanças Climáticas, uma das vedetes da Eco 92, tem pela frente uma missão delicada —evitar que uma proposta para combater o efeito estufa possa prejudicar países do Terceiro Mundo.
Estarão reunidos em Berlim, até 7 de abril, delegados dos 119 países que assinaram e adotaram a Convenção do Clima como lei internacional.
O acordo disciplina a emissão de gases que provocam o efeito estufa e causam o aquecimento da Terra. Agora, os países devem avançar nas metas previstas pelo tratado e chegar a um documento mais objetivo e de maior força legal —um protocolo.
O que está em jogo, no entendimento do governo brasileiro, é evitar a transferência de responsabilidades na emissão de gases poluentes dos países desenvolvidos para os países do Terceiro Mundo.
A Convenção do Clima estabelece, por ora, compromissos apenas para os países desenvolvidos. Eles respondem por 75% do total das emissões de gás carbônico (CO2), principal vilão do efeito estufa, produzidas por usinas de carvão e automóveis.
Pela convenção, estes países devem chegar ao final da década com as emissões de CO2 nos mesmos níveis de 1990.
A convenção, no entanto, abre uma brecha —possibilita aos países desenvolvidos reduzir suas emissões de forma isolada ou em conjunto. Ou seja, permite que um país industrializado, em vez de reduzir as emissões em seu território, o faça em outro lugar. É aí que está o temor do governo brasileiro.
O dispositivo, conhecido no jargão diplomático como implementação conjunta, causou inquietação entre países de Terceiro Mundo. Ele transfere o ônus da coisa, sem contar que instaura um modelo neocolonialista, diz o ministro Antonio Augusto Dayrell de Lima, chefe do Departamento de Meio Ambiente do Itamaraty.
Na prática, o conceito já está em vigor, embora vago na convenção. Os Estados Unidos, país que, sozinho, emite 25% do total de CO2, têm, por exemplo, um projeto de reflorestamento na Costa Rica. As árvores, ao crescerem, são uma importante fonte de absorção do carbono na atmosfera —ou seja, neutralizam, em parte, as emissões de CO2.
Se a convenção permitir, os EUA poderiam conquistar um crédito de emissões. Continuariam emitindo o mesmo ou mais em seu território, enquanto as árvores da Costa Rica fariam a compensação —sequestrariam o carbono da atmosfera. Só que a Costa Rica dificilmente poderia cortar estas árvores, o que bloquearia seu processo de desenvolvimento.
Esta proposta divide o mundo em eldorados verdes ao Sul enquanto os habitantes do Norte conviverão com overdoses de fumaça, diz Lima. Não queremos uma saída pela tangente que desvie a própria convenção.
Ela só pode existir se garantir a transferência de tecnologia dos países industrializados para os em desenvolvimento e se os países de Primeiro Mundo reduzirem efetivamente suas emissões.
A posição brasileira é endossada por ambientalistas. "A idéia é boa, mas, na prática, pode desviar responsabilidades", diz Rubens Born, coordenador da ONG Vitae Civillis, que acompanha as discussões em torno do tema.

Texto Anterior: Tucano entra na Justiça contra Quércia e Fleury
Próximo Texto: Abelhas têm capacidade para contar, sugere pesquisa alemã
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.