São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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Previdência é o tema que demanda maior negociação com o Congresso

MARTA SALOMON
SILVANA QUAGLIO

MARTA SALOMON; SILVANA QUAGLIO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso não imaginava que sua proposta de reforma da Previdência fosse enfrentar uma oposição tão grande logo de saída.
A questão que se mostrou mais polêmica, na semana passada, não foi propriamente a mudança nas regras da aposentadoria.
Pesquisa Datafolha mostrou que Câmara e Senado aceitam mudanças na área (Veja pesquisa nesta e na última páginas).
O que parece ter assustado os parlamentares é a amplitude das alterações que o governo pretende levar a efeito.
A emenda da Previdência é a que mexe, afinal, com o maior número de interesses no país.
"Ela atinge a vida de 160 milhões de brasileiros", avalia o líder do PFL na Câmara, Inocêncio Oliveira.
Esquartejamento
O esquartejamento a que a emenda foi submetida na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara —que decidiu dividir a emenda original, o que vai atrasar a tramitação— foi apenas o começo da reação.
Na noite de quarta-feira da semana passada, FHC tentou manter o sangue frio enquanto analisava a lista da votação que impôs a primeira derrota ao governo.
Nela estavam alguns deputados que o governo contabilizava como aliados certos.
Pouco antes, nos corredores do Congresso, os aliados, principalmente do PFL e do PMDB, tramavam contra a quebra do sigilo bancário dos devedores.
O presidente considera esse mecanismo o mais eficaz no combate à sonegação de impostos e contribuições à Previdência.
Com o argumento de que o governo misturou alhos com bugalhos, os tradicionais adversários da quebra do sigilo se juntaram aos opositores da reforma para conturbar ainda mais o cenário.
"Vamos aprovar a divisão da emenda e nos livramos do sigilo bancário", avaliou o líder do governo na Câmara, Luiz Carlos Santos (PMDB-SP), em conversa telefônica com o líder do PFL, deputado Inocêncio Oliveira (PE).
"Tem muita coisa ali que foi feita mesmo para negociar", investiu Inocêncio, logo depois, pelos corredores.
A decisão de incluir a quebra do sigilo no pacote da Previdência foi tomada por FHC depois de reunião do Conselho Político —composto por líderes governistas e presidentes de partidos.
Segundo a Folha apurou, FHC achava necessário apresentar uma "medida popular de impacto" para mostrar o interesse do governo em combater não apenas os privilégios, mas também a sonegação, uma das causas apontadas para o iminente colapso financeiro da Previdência.
Os conselheiros do presidente fizeram silêncio na reunião. FHC preferiu ignorar as resistências que derrotaram todas as tentativas anteriores de limitar o sigilo bancário, e os aliados passaram a tratar do assunto como mais um dos "bodes" do projeto.
No vocabulário dos políticos, toda vez que um projeto está para ser apresentado, coloca-se algum dispositivo polêmico -qual um bode numa sala- para ser negociado.
É este o espírito a que o projeto será submetido: só resta saber quanto da proposta original do governo conseguirá sobreviver ao bombardeio. Em poucas horas, no meio da tarde da última quinta—feira, o deputado Paulo Paim (PT-RS) armou a primeira bomba.
Ele conseguiu recolher 120 assinaturas de parlamentares contra a reforma na Previdência. Paim quer completar 300 assinaturas -o suficiente, segundo ele, para desestimular o governo.
O deputado Eduardo Jorge (PT-SP), autor de uma proposta alternativa, sugeriu que o debate fosse suspenso por seis meses. O líder do governo no Congresso, deputado Germano Rigotto (PMDB-RS), avaliou: "Não vamos mesmo votar esta proposta antes do segundo semestre".
Rigotto estava surpreso com a reação do Congresso. "Ninguém está entendendo nada, e os bagrinhos estão se juntando aos privilegiados". Com o adiamento do debate, calculou o líder, não se pensaria em aprovar uma reforma antes do ano que vem.
Na base política do Palácio do Planalto, ainda há muita hesitação sobre a oportunidade da reforma da Previdência. O presidente do PP, Álvaro Dias, tem dúvidas se "medidas tão drásticas" são mesmo necessárias.
"Esta reforma vai traumatizar as bancadas", calculou o líder do PTB, deputado Nelson Trad (MS). "Vai ser a grande matéria-prima de combustão", completou. Disso, aliás, ninguém no Congresso discorda.

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