São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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Reformas enfrentam cenário adverso

MARTA SALOMON; SILVANA QUAGLIO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A crise nos modelos econômicos do México e da Argentina —que afugentou capitais e abalou a onda de investimentos nas economias emergentes da América Latina— está impedindo o governo de fazer qualquer avaliação precisa sobre o impacto das reformas constitucionais.
A tese de abertura da economia, sustentada pelo governo sob o lema de atrair investimentos, começa a ser votada em junho, no plenário da Câmara, sem qualquer número oficial que a fundamente.
Mais de um mês depois de apresentar formalmente as propostas de quebra dos monopólios do petróleo e das telecomunicações e o fim de privilégios para as empresas de capital nacional, o governo alega que os resultados caíram no terreno do "imponderável".

Incertezas
A justificativa do governo volta-se para a incerteza do mercado internacional.
Desta forma, a aprovação rápida das reformas teria imediatamente um efeito mais psicológico do que prático na estabilização da economia, apurou a Folha junto a ministros e lideranças políticas.
"O país não acaba sem as reformas", vem repetindo o ministro Pedro Malan (Fazenda) a seus interlocutores.
Malan empenha-se em garantir condições ideais na economia brasileira para atrair investimentos estrangeiros, apontado como fonte para uma nova era de crescimento interno.
"O país sem reformas continua com as mesmas dificuldades de um país antigo, fora do contexto internacional", completa o ministro Nelson Jobim (Justiça).
Ele tem frequentado quase diariamente o Congresso com a missão de conter focos de rebelião dos políticos e garantir apoio para as reformas.
Não menos urgente no discurso do governo, a polêmica reforma da Previdência Social só terá resultado a "médio e longo prazos", informa uma cartilha preparada pelo governo para convencer os políticos.
"Pequenos serão os resultados, em termos atuariais e financeiros, disponíveis nos próximos dois ou três anos", calcula o documento, onde não faltam números sobre o tamanho da crise da Previdência, que estaria beirando o colapso financeiro.
Sem a reforma —que ameaça implodir a base governista—, faltará dinheiro para pagar as aposentadorias e pensões, alega o ministro Reinhold Stephanes (Previdência).
O governo reconhece que os recursos da Previdência foram desviados no passado recente até para a construção de hidrelétricas e siderúrgicas.
Sem reservas, o sistema vai mal, na proporção de dois contribuintes para cada aposentado.
Como a população está envelhecendo, as perspectivas para os próximos 25 anos tornam-se dramáticas, calcula o documento do governo: poderá haver mais aposentados que trabalhadores na ativa contribuindo para o sistema.

Justificativas
Este quadro é apresentado como justificativa para a proposta de acabar com a aposentadoria por tempo de serviço.
O maior problema do governo, porém, está nas aposentadorias no setor público. Em 10 anos, estima o ministério, a União e a maioria dos Estados e municípios estarão comprometendo toda a sua arrecadação com o pagamento dos funcionários ativos e inativos, os últimos em maior número.
Sem números oficiais, o debate da abertura econômica está sujeito às diferentes contabilidades apresentadas pelos defensores e opositores da reforma.
O mais forte aliado do governo na quebra dos monopólios é o BEM (Bloco da Economia Moderna), que agrega parlamentares liberais.
O grupo calcula uma demanda de investimentos de US$ 100 bilhões na área de petróleo e outros US$ 32 bilhões nas telecomunicações —uma cifra que os cofres públicos não suportariam.
Para os adversários da quebra dos monopólios estatais, a abertura econômica preconizada pelo governo vai dilapidar o patrimônio público e estimular a ação no país de cartéis e oligopólios.
Um documento do PDT alega que a produção nacional de petróleo cresceu três vezes mais que a demanda, desde 1979. Os investimentos da Petrobrás só não teriam sido maiores porque o próprio governo obriga a empresa a vender os derivados do petróleo abaixo dos preços internacionais.
(Marta Salomon e Silvana Quaglio)

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