São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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O projeto Cingapura

O projeto Cingapura
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LUÍS NASSIF

Com o projeto Cingapura (de urbanização de favelas com verticalização), pela primeira vez desde que assumiu a prefeitura, o prefeito Paulo Maluf prioriza um projeto de largo espectro social, que passa ao largo da sua megalomania rodoviária e dos contratos nebulosos com grandes empreiteiras.
Criado pelo secretário da Habitação Lair Alberto Krahenbuhl, o projeto foge do remendo da urbanização pura e simples de favelas (bandeira do PT) ou do confinamento do favelado em áreas distantes (base da ação de Jânio e mais próximo ao pensamento de Maluf). E recorre a fontes de financiamento internacionais e instrumentos legais da prefeitura para conferir aos favelados o primeiro certificado de cidadão: o endereço permanente.
O primeiro passo do programa foi mapear as favelas com mais de cem unidades, preferencialmente erguidas em áreas de risco, perto de encostas e córregos.
O passo seguinte é contatar o proprietário, para permitir a legalização do terreno. Enquanto se constrói o prédio, os favelados mudam-se de seus barracos de 16 metros quadrados para alojamentos provisórios, de 30 metros quadrados, enquanto aguardam os apartamentos de 42 metros quadrados que lhes serão entregues a um custo total de US$ 7.800 a US$ 8.500.
O projeto está sendo financiado por um Fundo Municipal de Habitação, com recursos do Bird, verbas orçamentárias e o chamado potencial construtivo —a possibilidade de o construtor pagar à prefeitura para poder construir área maior do que a prevista em lei.
Assistência social
No período em que permanece nos alojamentos, parte da mão-de-obra favelada é aproveitada na própria obra, por imposição contratual. E todos os favelados são submetidos a um processo de assistência social, para prepará-los para morar em coletividade e autogerir o condomínio. Simultaneamente, concentra-se em cada favela urbanizada o aparato público, como postos de saúde e creches.
Não há paternalismo. As unidades são vendidas, embora a juros subsidiados e prazos de 15 a 20 anos. E —apesar da enorme pressão de políticos aliados— não se tem notícias, até agora, da distribuição de moradias subordinada a critérios políticos.
Os números iniciais ainda são tímidos perto da população favelada de São Paulo. No momento há 14 projetos em andamento, com 12 mil unidades abrigando 70 mil pessoas. Na segunda fase, deverão ser construídas mais 13 mil unidades, abrigando 75 mil pessoas. O projeto total prevê a urbanização de 170 favelas, atendendo a uma população de 400 mil pessoas.
Homem público
É bom ficar de olho nesse secretário Lair Krahenbuhl, um empresário do setor da construção civil que, desde que sua empresa estabilizou-se gerencialmente, resolveu tornar-se homem público. É dele o plano habitacional incluído no programa econômico de Mário Covas, quando candidato à Presidência da República, e que depois foi aproveitado pelo governo Collor.
Além do Cingapura, é de sua responsabilidade a razia que o Contru está fazendo nos prédios de São Paulo, adotando um rigor inédito nas normas de segurança, ajudando a mudar a cultura de construção na cidade.
No momento, prepara-se para lançar um Cingapura privado, onde donos de terrenos ocupados por favelas e em litígio poderiam regularizar a posse em troca de montar um projeto para os favelados. E também para instituir o registro eletrônico de plantas na prefeitura.
Trata-se da melhor vocação pública surgida em São Paulo nos últimos anos.

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