São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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Oscar é basicamente um programa de TV

ANA MARIA BAHIANA
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

Apesar de toda a sua pretensa pompa e circunstância, a entrega dos Oscars é, essencialmente, um programa de TV. Um programa longo —três horas—, trabalhoso —números musicais elaborados, vasto elenco—, mas de platéia certa: este ano, quase 1 bilhão de espectadores em 91 países, mais os EUA, de costa a costa.
A transformação do evento, de um jantar de gala mais íntimo entre as cabeças coroadas da indústria a um show de TV, começou em 1953 quando, pela primeira vez, câmeras de TV tiveram ingresso autorizado na festa.
Foi um acontecimento à época. Astros e estrelas de Hollywood teriam sua privacidade violada. Dizia-se que a festa iria decair.
A festa não decaiu, mas transformou-se. As redes de TV logo descobriram o potencial comercial das estatuetas. Em 66 veio a transmissão colorida. Em 70, a transmissão via satélite, tornando o mundo a grande platéia do evento.
A essa altura, o Oscar não podia mais viver sem a TV: divididos entre a Academia e a rede responsável pela transmissão (a ABC, desde 1975), os direitos de transmissão tornaram-se a principal fonte de renda para cobrir os custos cada vez mais altos da festa.
Este ano, tanto a Academia quanto a ABC devem estar preocupadas: caiu de 106 para 91 o número de países compradores da transmissão e, em muitos países, não é mais a rede líder de audiência que exibe o evento.
A boa notícia é que, este ano, 70 países optaram pela cobertura integral, ao vivo —mais elaborada e, assim, mais cara. É um número recorde. Os outros 21 países terão um pacote editado de 90 minutos com os destaques da noite.
Por ser um programa de TV, o Oscar é rigorosamente programado, roteirizado e ensaiado.
A produção começa seis meses antes, quando os cabeças da equipe —há seis anos, a dupla Gilbert Cates, produtor, e Jeff Margolis, diretor— escolhem um tema e contratam designers para elaborar esboços e maquetes dos cenários.
A contratação e o ensaio dos músicos e bailarinos vêm a seguir. Aos músicos, sob a coordenação de um maestro/diretor musical, cabe a árdua tarefa de aprender não só todas as vinhetas do show e as trilhas dos balés, mas também todos os temas musicais dos filmes indicados em todas as categorias.
Começam também nesta época as longas, extenuantes e intrincadas negociações para arregimentar os astros e estrelas que servirão de apresentadores convidados.
É tarefa para diplomatas: antes de dizer "sim", os astros e seus agentes querem saber que Oscar vão apresentar (os menos cotados são os prêmios técnicos, documentários, animação e curta-metragem), com quem vão apresentar, a que horas do show entrarão em cena (se possível nos 40 minutos finais, quando saem os grandes prêmios), e que texto dirão.
O texto, lido no tele-prompter tanto pelo anfitrião quanto pelos convidados, começa a ser escrito três meses antes da festa, em geral por uma equipe de dois redatores comandados por um editor.
Há que ser espirituoso (ou alguém acha que as piadas são espontâneas?), mas respeitoso. Informal, mas sempre mencionando o atual ou futuro filme do convidado (isto é Hollywood: tudo é business, ainda mais com uma platéia de um bilhão de espectadores).
Tanto o anfitrião quanto os convidados têm poder de veto e revisão sobre o texto, mas espera-se que o improviso seja evitado. A não ser no caso de uma falha técnica (inevitável num show ao vivo), como o sumiço de um astro que atrasou no banheiro (aconteceu com Dustin Hoffman em 88) ou um palco giratório que se recusa a girar (aconteceu em 90).
Nessa hora aparece no tele-prompter a palavra mais temida por qualquer apresentador: "strech", estique. É hora de encarnar nos amigos, rememorar velhos tempos e contar piadas.
Tudo pronto, hora de ensaiar. Os ensaios gerais, no palco escolhido para o evento, começam uns dez dias antes e contam, quase sempre, com a presença do anfitrião da noite —a única pessoa em cena a saber exatamente tudo o que vai se passar na festa.
Os convidados recebem os textos na véspera. Nem todos têm tempo ou paciência de ensaiar —afinal, são profissionais.
Três horas antes de ir ao ar, chega o ônibus dos figurantes. Em traje de gala, eles se encarregarão de preencher as poltronas que ficarem vazias (e ocupar o lugar dos premiados quando estes se levantarem para receber a estatueta).
Quinze minutos antes, o diretor faz dá as derradeiras instruções para palco e platéia: aplaudam e sorriam muito e divirtam-se. Afinal, Hollywood, esta é a sua noite.

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