São Paulo, sexta-feira, 14 de abril de 1995
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Argumentos da agricultura

LUÍS NASSIF

Do leitor Hugo Eduardo Giudice Paz, presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul, a respeito da coluna "O paradoxo da choradeira":
"Ao longo dos últimos dez anos, desde o Plano Cruzado, enquanto os preços das commodities ou eram congelados ou tabelados, os custos financeiros eram incrementados com a famosa correção monetária pró rata tempore. Com o Plano Collor, literalmente da noite para o dia os contratos agrícolas foram acrescidos em 84% e os produtos agrícolas em apenas 42%. Transferência líquida de renda do setor agrícola para o setor financeiro. Em nenhum dos planos havia contratos autorizativos para que os acréscimos deles decorrentes fossem incluídos nas nossas promissórias. Mas ainda assim as 'empilhadeiras' dos governos e do sistema financeiro fizeram seu trabalho. O Congresso Nacional, ao apreciar a Medida Provisória que criou a URV, inseriu dispositivo que vinculasse a 'atualização monetária' aplicada aos contratos agrícolas àquela que corrigisse os preços dos produtos. Vetado o dispositivo, configurou-se a hipótese prevista. Nos dias que correm, enquanto os preços médios dos produtos despencam 23,11%, os contratos são corrigidos a 45,04%. Mas, o mais grave, o depositante da poupança só recebe 24,72% no mesmo período. A receita bruta do sistema financeiro supera a casa dos 90,23%. Buscar recursos no exterior ao custo de 18% ou 20% de juros mais correção cambial, residindo e produzindo num país que não consegue divulgar uma nota sobre política cambial sem ocasionar uma hemorragia de divisas fortes, parece ser um ótimo negócio para quem for banqueiro ou preposto dele."

Quem paga
O ruralista tem razão em suas críticas à falta de uma política agrícola. Na primeira semana de real, analistas agrícolas já desenhavam o impasse. Mas também dá razão aos críticos ao não apontar uma saída racional para o problema.
Hoje em dia, qualquer setor que pleiteie tratamento diferenciado tem que expor claramente à opinião pública quais suas propostas concretas de solução definitiva dos problemas. Ninguém suporta mais a repetição reiterada de problemas, a dependência permanente de políticas provisórias e a falta de disposição de mudar.

O desafio da coluna -que reconheceu os problemas dos agricultores- foi claro: subsídio tem custo. Quem paga? Tem-se numa ponta o investidor, na outra o tomador e no meio o banco.

Em fax à coluna, o deputado Nélson Marquezelli tem proposta objetiva: que os bancos paguem parte da conta, voltando a destinar 25% de seus depósitos à vista para o crédito rural -modelo que no passado recente foi responsável por inúmeras distorções, como a troca de chumbo entre bancos para reservar o filé mignon do crédito barato para si.

Além disso, não se pode jogar todos os produtores no mesmo balaio. Subsídios só se justificam se houver como contrapartida a redução interna dos preços para os consumidores. O que não ocorre com commodities, cujo referencial de preço são as cotações internacionais.

Mas o sr. Paz não aceita sequer financiamentos em dólares para commodities. Qual é? Se o dólar se valoriza, aumenta o custo do financiamento, mas aumenta também o preço da safra.

Quando o descasamento entre preços e taxas for contra, o prejuízo é do Tesouro -quando for a favor, o lucro é do agricultor.

A melhor maneira para as lideranças rurais conferirem legitimidade a seus pleitos é mostrar -elas próprias- disposição de mudar.

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