São Paulo, segunda-feira, 24 de abril de 1995
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Belly cede ao pop desavergonhado

DANIEL BENEVIDES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há dois anos o Belly, quarteto de Boston liderado pela ex-Breeders e ex-Throwing Muses Tanya Donelly, lançava "Star", um disco essencialmente pop, mas que trazia nas letras e arranjos uma certa estranheza. Como se o pop, para ser digno, tivesse que estar ligeiramente fora de foco.
O resultado foi que, sem ser brilhante como em suas bandas anteriores, Donelly (e os irmãos Gorman, Chris na bateria e Tom, na guitarra) alcançou com "Star" a marca de um milhão de cópias vendidas, além de duas indicações para o Grammy e outras duas para o Video Music Awards da MTV.
"King", o segundo álbum, apesar de algumas diferenças importantes, parece seguir pelo mesmo caminho -ao menos já rendeu ao Belly várias capas de revista, inclusive a da "Rolling Stone".
Estão lá os ganchos pop irresistíveis ("Puberty", "Red", "Super-Connected"); a esquisitice nas letras, quase nunca diretas e na maior parte indecifráveis ou plenas de duplo sentido: surpresas nos arranjos, com algumas viradas bruscas; e produção impecável, a cargo do veterano inglês Glyn Johns, antigo engenheiro de som dos Beatles, Stones, Clash e Who.
E estão também as diferenças, como as assinaturas das composições, agora acrescidas em algumas faixas dos nomes de Tom Gorman e da nova baixista, a exuberante Gail Greenwood. Mas a principal delas é que desta vez o disco foi praticamente todo gravado ao vivo num estúdio nas Bahamas. Certo, o som está mais espontâneo e energético, mas sumiram algumas sutilezas que faziam "Star" ser, digamos, especial.
"King" acabou ficando mais desavergonhadamente pop, o que pode ser ótimo para o mercado, mas que de certa forma soa como um passo em falso na química peculiar do grupo. Principalmente se se considerar a voz suave e calorosa de Tanya Donelly, que tende a ficar chata ou até mesmo irritante quando escala nos agudos dos refrões mais fáceis ou óbvios (como em "Now They'll Sleep", primeiro single e clipe do disco, ou "Super-Connected", uma boa letra desperdiçada).
Mas há alguns bons momentos que salvam o disco de uma decepção maior. É o caso da bela e comovente canção de amor "Seal My Fate"; a divertida "Red", com seu refrão inesperado (uma as poucas exceções); a delicadeza sincera de "Silverfish" e "Judas My Heart"; a leve ousadia em "Untitled and Unsung".
Ainda assim, fica a sensação de que, dentre as muitas bandas lideradas por mulheres de Boston (Throwing Muses, Breeders, Juliana Hatfield, Letters to Cleo, Come, Sun 60) o Belly não é a melhor. Talvez a mais simpática.

Disco: King
Banda: Belly
Selo: Natasha
Preço: R$ 20 (em média, o CD)

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