São Paulo, segunda-feira, 1 de maio de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Recital materializa fantasma de Wagner

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

Quem visita a Villa Wahnfried em Bayreuth (nordeste da Alemanha) é capaz de perceber os miasmas daquele que a habitou por duas décadas. Tudo ali recende a Richard Wagner (1813-1883).
Uma parte do fantasma wagneriano se materializa no recém-lançado CD ``Concert in Villa Wahnfried", com o pianista alemão Gerhard Oppitz, 42, e a contralto francesa Nathalie Stutzmann, 30.
O disco foi gravado entre 30 de março e 3 de abril de 1993 em Wahnfried, mansão do músico.
Pesa maldição sobre o lugar. Era, por exemplo, o playground do chanceler Hitler. Ele frequentou a mansão dos anos 20 aos 40. A ponto de os netos de Wagner, Wolfgang (hoje chefe do wagnerismo em Bayreuth) e Wieland, chamarem-no de ``tio Afi". Hitler os levava para dormir, cantando-lhes trechos do ``Crepúsculo dos Deuses" como se fossem canções de ninar.
Fontes extra-oficiais aventam que Wieland, mais tarde diretor cênico, teria sido assediado sexualmente pelo ``titio".
A casa foi projetada por Wagner como templo para o ego. Fez construir um salão dotado de um piano Steinway para deleite próprio.
Ali o seu sogro, o compositor Franz Liszt (1811-1886), estreou muitas das paráfrases de ópera que compôs em sua honra.
Durante o nazismo Wahnfried virou ringue de disputa entre herdeiros. Os norte-americanos bombarderam-na. Desde então, abriga o sombrio museu Wagner.
O CD mimoseia o ouvinte com o lúgubre ectoplasma de Wahnfried. Ele se vê num sarau além-túmulo promovido pelos dois mestres para uma audiência de almas penadas.
O repertório é ignoto. São oito composições de Wagner e quatro de Liszt, ausentes das salas de concerto e desprezadas pelos próprios autores. É música paródica, que remete a outras peças.
Oppitz toca com perícia ao Steinway de Wagner. Inicia com ``Uma Sonata para o Álbum de MW" (1847). Esta sugere o prólogo de ``Crepúsculo dos Deuses".
Nathalie interpreta quatro austeras canções em francês, escritas por Wagner na época em viveu em Paris, por volta de 1840. Exibe vitalidade e voz poderosa.
As peças para piano de Liszt são todas em memória ao genro. Cuidado com a vagarosa ``No Túmulo de Richard Wagner" (1883). É a imagem sonora da morte.
(LAG)

Disco: Concert in Villa Wahnfried
Lançamento: RCA Victor/BMG Ariola
Preço: R$ 20

Texto Anterior: Quartetos de Beethoven saem do estúdio
Próximo Texto: Harnoncourt reinventa clássicos de Bach
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.