São Paulo, segunda-feira, 1 de maio de 1995
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Um bípede em transição

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - É impressionante a semelhança entre o cotidiano de um político do PT e a rotina de um bovino. A vaca e o petista não nasceram para a solidão. São seres coletivos, aos quais não é permitido um único e escasso instante de individualidade.
Imagine uma boiada no pasto. Pense agora em uma bancada de petistas no Congresso. Evite mesclar as imagens. Embora parecidos, a vaca e o petista não se misturam a outras raças.
Súbito, uma rês desgarra-se da massa. E um petista pula a cerca do curral traçado pela direção do partido. Ambos serão tangidos de volta à rotina vacum. A novilha, pelo peão de boiadeiro. O outro, pelos patrulheiros ideológicos.
Alguns dos mais ativos deputados do PT enfrentam no momento a sanha da patrulha. Parlamentares como José Genoíno e Paulo Delgado atreveram-se a pensar. E não tardaram a ouvir o berrante, entoado por ninguém menos que Lula.
Diante de uma inevitável reforma da Constituição, os petistas rebeldes defenderam que seu partido apresentasse propostas. Vencidos, começaram a pastar em outras pradarias, foram mugir em outras freguesias.
Participaram de algumas poucas reuniões, convocadas para debater o conteúdo das emendas constitucionais. Estão agora sendo chamados a dar explicações. Ou retornam ao tedioso cercadinho partidário, ou serão renegados.
O caso é inusitado. Uma das faces mais hediondas do período em que o governo brasileiro vestiu fardas era a censura. Pois o PT, ex-opositor da fase do quepe, censura-se a si mesmo.
Não fosse pela dessesmelhança física, diria que não há distinção entre um petista típico e uma vaca de presépio. Mas, a julgar pelo comportamento do partido, as diferenças tendem a se encurtar.
O PT argumenta que é contra a reforma porque, ao contrário da maioria, tem os pés no chão. Sabe o que é bom e o que é ruim para o país. Não demora e terá também as mãos grudadas ao solo.

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