São Paulo, quinta-feira, 18 de maio de 1995
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Propaganda exagera realizações do império

ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE
DO CONSELHO EDITORIAL

Inca é a denominação atribuída atualmente à nação cujos próprios cidadãos a chamavam de Tawantisuiu, ou seja, ``o país dos quatro cantos".
Inca designava o dirigente máximo, sua família, uma dinastia. É como se chamássemos os egípcios de faraós, os romanos de césares e os brasileiros de cardosos.
Por que teria ocorrido esta distorção? É possível que a razão tenha sido a grande influência que a ``propaganda" parece ter tido na administração do Império Inca.
Os incas conseguiram, por exemplo, convencer os espanhóis que eram eles os responsáveis pelo elevado nível de cultura alcançada na região por eles ocupada. Todavia, isto não é verdade.
Na imensa região que o império inca conquistou entre 1438, época de sua primeira pulsação expansionista, até 1532, data da conquista espanhola, cerca de seis milhões de habitantes distribuídos em pelo menos uma centena de culturas, se acomodavam.
Seis milhões era também a população da Espanha a esta época. Em uma estreita faixa entre o litoral e Andes, estendendo-se por mais que quatro mil quilômetros, ocupava o império inca praticamente o que é o Chile povoado hoje, o Noroeste da Argentina, o Oeste do Equador, do Peru e da Bolívia e o Sudoeste da Colômbia.
Nesta imensa região, durante quatro mil anos antes da ascensão incaica, ocorreram oscilações frequentes entre períodos de agregação sob uma liderança forte e períodos de fragmentação.
Os incas pretendiam ter conseguido uma unidade cultural, política e religiosa, o que seria um feito sem precedentes para um período tão curto, menos que cem anos. Há indícios, entretanto, de que uma religião homogênea foi alcançada. O uso deliberado de propaganda parece ter sido decisivo.
Este feito é tão mais impressionante quando nos lembramos que os incas contrariamente aos maias e aos astecas, por exemplo, não tinham qualquer forma de escrita.
Sonho socialista
Sua propaganda era tão intensa que possivelmente chegaram a acreditar que, de fato, haviam conseguido uma redistribuição ampla de alimentos entre povoados com diferentes climas, controlado pelo Estado, ao estilo do planejamento soviético.
Aparentemente este sonho socialista nunca se realizou. Cerca de 500 anos depois, ainda estamos tentando. Pois bem, esta utopia foi passada para os espanhóis como uma realidade e teve o nome de Arquipélago Vertical.
Todavia, tudo indica que as povoações resolviam seus problemas de suprimento localmente.
Alguns autores acreditam, entretanto, que o sucesso do império inca se deve a uma legislação um pouco bizarra.
O inca, ou seja, o imperador era geralmente muito rico e precisava dessa riqueza para manter a sua corte, o seu prestígio e o seu poder.
A lei, entretanto, não permitia heranças para descendentes ou para outros cidadãos quaisquer. Seus bens, ao morrerem, seriam usados para manter seus cultos, sua múmia etc.
Ora, o descendente sendo pobre teria que conquistar novos territórios, novos tesouros, novos súditos. Sem conquistas perderia o poder. Inventaram, ao que parece, também o capitalismo selvagem.
Apesar dessas dificuldades, entretanto, um enorme senso de organização lhes era peculiar. Os quatro cantões, que tinham Cuzco ao centro, eram dirigidos por governadores.
Os cantões se dividiam em províncias (municípios) dirigidos por prefeitos. Todas essas posições eram ocupadas de acordo com complexas relações de parentesco com o inca de cargo superior.
Ao que parece até mesmo o nepotismo foram os incas que institucionalizaram e não o Congresso Nacional.

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