São Paulo, sábado, 27 de maio de 1995
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Entre Thatcher e São Petersburgo

CLÓVIS ROSSI

Decisão judicial tem que ser cumprida, goste-se ou não dela. Mas nem por isso é imune a críticas. Caso da decisão de ontem do TST sobre a greve dos petroleiros.
Não parece razoável que um tribunal que é tanto de julgamento como de conciliação desconheça um acordo que levava a assinatura do então ministro das Minas e Energia, conforme fac símile publicado por esta Folha.
O tribunal parece ter se apegado à tecnicalidades jurídicas para passar por cima do acordo, deixando os petroleiros completamente desamparados do ponto de vista jurídico.
É de se esperar, agora, que o governo não siga idêntico caminho, até porque sua ação é eminentemente política. Pode, portanto, prescindir mais facilmente das tecnicalidades. Além do acordo assinado por seu antecessor, o ministro Raimundo Brito se comprometeu ao diálogo, no discurso pela TV, com o que cria para o governo o duplo compromisso moral de negociar tão logo os petroleiros voltem ao trabalho.
A estes, aliás, não sobra alternativa. A não ser que pretendam conferir a uma greve que juram ser meramente reivindicatória um caráter revolucionário, de confronto aberto e total com o governo, coisa que não terão condições de sustentar.
Mas o governo tampouco pode ser tomado pela síndrome de Margareth Thatcher e pretender quebrar a espinha dorsal de um setor vital do sindicalismo cutista. Em países civilizados, o movimento sindical costuma ser um parceiro relevante, por mais que, aqui e ali, colida de frente com o governo de turno ou com o patronato.
Se a embriaguez da vitória tomar conta do governo, vai acabar aceitando a tese, no mínimo discutível, de que acaba de ganhar o terceiro turno das eleições (segundo, na verdade, porque só houve um no pleito presidencial). E, em consequência, pode pretender somar à vitória a humilhação do movimento sindical ou, ao menos, de sua vertente cutista, a mais militante e organizada.
Seria miopia tão grande quanto o sindicalismo imaginar que Cubatão é São Petersburgo, o berço da Revolução Russa de 1917.

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