São Paulo, sábado, 27 de maio de 1995
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Moleques

GILBERTO DIMENSTEIN

Ao julgar ontem pela segunda vez a greve dos petroleiros, o Tribunal Superior do Trabalho disse que o acordo entre a categoria e o governo, firmado no ano passado, é ``eticamente válido". Justo reconhecimento.
A verdade: os petroleiros têm toneladas de motivos para se sentirem trapaceados como se fossem moleques. A palavra do tribunal apenas reforça esse compreensível sentimento, ao dar-lhes razões éticas em suas reivindicações.
Os petroleiros, afinal, fizeram um acordo apoiado por ninguém menos do que um presidente da República e assinado por um ministro de Estado. Vê-se que a palavra de um presidente da República vale menos, por exemplo, do que a de um bicheiro, acostumado a pagar o que deve -nem precisa assinar nada.
Se o governo peca pela falta de cumprimento de um acordo, os dirigentes sindicais mostram como sua irresponsabilidade não tem limites. Decidiram continuar parados em greve apesar de, mais uma vez, a Justiça considerar a greve abusiva -portanto, ilegal.
A CUT estimula essa insensatez e mandou dizer que, amanhã, tenta articular uma greve geral de apoio aos petroleiros. Ou seja, quer aumentar ainda mais o desafio à lei e, portanto, às normas democráticas.
É uma tática do desespero de quem não enxerga saída. O movimento está cada dia mais isolado das forças políticas e da opinião pública, aborrecida com os incômodos causados pela escassez de combustível.
A irresponsabilidade tem duas facetas. Primeira: as camadas mais pobres são as mais atingidas. Segunda: estão em jogo os empregos de chefes de famílias, cujos contracheques começaram a vir em branco.
Se o governo se comportou como moleque por não cumprir a palavra de um presidente da República, a CUT e os demais sindicatos também comportam-se como moleques ao desafiar a Justiça, numa chantagem indesculpável.
Pena que não exista um líder no país capaz de convencer os sindicalistas de que estão cometendo um desatino e quanto mais tempo demorarem a voltar ao trabalho, pior.

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