São Paulo, sábado, 10 de junho de 1995
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Os monopólios e a reforma do Estado

FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA

A questão dos monopólios estatais tem sido um tema controverso em nossa história, e em muitas ocasiões a paixão predominou sobre a razão. Ao longo do tempo os argumentos para a defesa do monopólio têm mudado.
Atualmente o principal argumento daqueles que defendiam o monopólio é de que setores estratégicos da economia devem estar sob a responsabilidade do Estado. Por exemplo, Vicentinho, da CUT, afirmou recentemente (Folha, 4/7/95) que é a favor do monopólio ``porque... uma nação que se preza deve ter controle de um bem estrategicamente importante, para sua autonomia política e financeira".
No critério de Vicentinho, o Japão não é uma nação que se preza, pois lá não existe uma Petro-Japão, apesar da dependência de quase 100% do petróleo importado por empresas multinacionais. Apesar disso o Japão é rico e tem uma distribuição de renda invejável.
A experiência dos países da Europa, da América do Norte e da Ásia, que além de ricos têm uma renda bem distribuída entre seus cidadãos, mostra que existem três variáveis estratégicas para uma nação: 1) educação; 2) poupança doméstica; 3) capacitação tecnológica.
Não existe país rico com um povo analfabeto. Tampouco se elimina a pobreza vivendo da poupança alheia para financiar investimentos. Copiar tecnologias é o começo do aprendizado, mas nenhum país pode se tornar rico e independente sendo um mero usuário de tecnologias importadas.
A quebra dos monopólios estatais não pode ser analisada e compreendida a partir de uma visão estreita que atribui um papel estratégico onde ele não existe, mas sim dentro de uma perspectiva da reforma do Estado brasileiro, que tem como objetivo a construção dos alicerces de um novo modelo de crescimento.
O Estado deixará de exercer funções onde sua atuação é desnecessária, como na produção de bens e serviços, para dar lugar à iniciativa privada que é mais eficiente. Essa transferência de funções vai liberar recursos para que o Estado atue de modo eficiente onde ele é insubstituível, como é o caso da educação primária e secundária.
A quebra dos monopólios estatais não trará benefícios reais, a curto prazo, para o consumidor em termos de atendimento da demanda insatisfeita de telefones e da melhoria de qualidade dos serviços de telecomunicações, porque os investimentos necessários para resolver esses problemas exigem um prazo um pouco maior.
No caso do petróleo, a melhoria da qualidade dos produtos também não poderá ser feita da noite para o dia. Todavia, a aprovação da quebra dos monopólios pela Câmara dos Deputados representa de maneira inequívoca o compromisso do governo com a solução da crise fiscal do Estado, responsável pela inflação brasileira dos últimos 15 anos.
Esse fato contribuirá para que a sociedade aumente o grau de confiança no Plano Real, ajudando na estabilização da economia por meio de uma expectativa menor de inflação para os próximos meses, beneficiando os consumidores, especialmente os mais pobres, que são os mais afetados pela inflação.
Embora a prioridade atual seja o combate à inflação, o governo deve começar a tratar do que é realmente estratégico para que o Brasil se torne um país rico e menos injusto: educação, poupança doméstica e tecnologia. A experiência mundial demonstrou que a propriedade estatal dos meios de produção nunca foi solução, mas sim um problema, agora parcialmente resolvido em nosso país.

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