São Paulo, quinta-feira, 15 de junho de 1995
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Seriedade

Parece que a moda do ``esqueçam tudo o que eu disse" pegou mesmo no governo federal. Na sexta-feira passada, o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, declarava que o Planalto não estava trocando votos a favor das propostas de reforma constitucional por cargos. A quem duvidasse, Motta sugeria que passasse os olhos pelo ``Diário Oficial", que, segundo ele, seria a melhor fonte para esse tipo de pesquisa.
Anteontem, em Paris, passando uma borracha sobre sua fala da semana anterior, Motta admitiu que o governo trocou nomeações nas telefônicas federais por votos em favor da flexibilização do monopólio das telecomunicações.
O ministro também estava errado quando disse que a melhor fonte para desvendar manobras fisiológicas era o ``Diário Oficial". O PTB, partido aliado do governo, por exemplo, chegou a elaborar uma lista com seus candidatos a cargos no governo. Ao lado do nome do candidato e do posto almejado consta uma curiosa coluna QI (Quem Indicou). A cada caso atendido, dá-se baixa no processo com a rubrica OK.
Apesar de o presidente Fernando Henrique Cardoso ter prometido que não haveria fisiologia em seu governo, só os mais ingênuos acreditaram que isso seria possível. Políticos são ávidos por cargos e não hesitam em exigi-los ameaçando imobilizar todos os projetos do governo no âmbito do Legislativo. Ignorar isso é ignorar a natureza do homem e da política.
Um mínimo de saudável pragmatismo recomenda que o governo de fato negocie nomeações com os partidos. Embora essa seja uma prática lamentável que se gostaria de ver erradicada do Congresso Nacional, é melhor para o país que o Planalto consiga aprovar seus projetos.
É preciso, contudo, que as nomeações sejam feitas da forma mais transparente possível e que critérios de capacitação técnica sejam observados. Os limites entre a negociação política legítima e a fisiologia espúria são muito tênues, e a transparência é a melhor forma de torná-los um pouco mais claros.
De resto, o governo só tem a perder em credibilidade quando desdiz o que afirmara com menos de uma semana de antecedência.

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