São Paulo, terça-feira, 20 de junho de 1995
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Imaginação criativa

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

O argentino Carlos Menem chegou sorridente, segundo a Manchete. Chegou conciliador, na descrição da Cultura.
Segundo a Globo, ``Carlos Menem disse que está otimista e que a Argentina está disposta a rever os acordos que possam prejudicar países envolvidos. Mas..." -e acabaram-se os sorrisos- ``diz que nada pode deixar de ser aplicado".
Quer dizer, tem que valer o escrito em Ouro Preto.
Ninguém cuidou de lembrar, mas o presidente brasileiro também chegou sorridente, conciliador e otimista.
Também chegou falando, ``nós vamos manter o escrito", insistindo na Bandeirantes que ``protocolo internacional vale. Agora..." -e acabaram-se os sorrisos- ``nessas horas tem que ter imaginação criativa e se ajustar às realidades".
O otimismo e a conciliação, da boca para fora, a exemplo dos sorrisos, enfrentavam a oposição das realidades.
Acontece que, dizia e repetia Fernando Henrique, na Jovem Pan, ``política econômica não é uma ciência, é uma arte".
Imodesto, o autoproclamado artista da economia jogou na mesa o resultado de sua grande ``imaginação criativa".
Em entrevista coletiva, o presidente brasileiro dividiu o problema em ``dois aspectos diferentes". Um deles seriam ``as importações", nas quais ``a participação da Argentina é modesta e não há dificuldade em acertar um regime que não prejudique a Argentina".
O outro aspecto seriam ``os investimentos". Para Fernando Henrique, ``o Brasil tem tanto interesse quanto a Argentina e os demais em ampliar sua faixa de investimentos." Para tanto, quer condições iguais.
No dizer do SBT, um acordo para que ``as multinacionais possam decidir onde é mais vantajoso investir, se aqui ou na Argentina". Algo como, quem dá mais, se Resende ou São Carlos, na luta pela nova fábrica da Volkswagen.
Para Fernando Henrique, ``não é um jogo de soma zero. Os dois podem ganhar."
Foi ``criativo" o bastante para Cid Moreira promulgar, no Jornal Nacional, ``Brasil e Argentina selam a paz".
Um dia redondo, perfeito, do sorriso de Carlos Menem ao sorriso de Cid Moreira.
Até que entrou a Manchete, para estragar a festa:
- O governo brasileiro cede às pressões argentinas.

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