São Paulo, domingo, 2 de julho de 1995
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Duas Câmaras ditam as leis no sertão

ARI CIPOLA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM ÁGUA BRANCA

O prefeito de Água Branca (AL), Luiz Xavier de Sá, 65, o único do PT no Estado, criou uma nova Câmara Municipal, com cinco vereadores que o apóiam.
Os outros cinco vereadores, de oposição e vinculados ao deputado estadual Roberto Torres (PTB), permanecem na antiga Câmara da cidade. Mas as duas estão impedidas por lei de atuar e votar projetos, porque não têm um mínimo de seis vereadores.
O prefeito de Água Branca -cidade com 18,5 mil habitantes, no oeste do Estado- reconhece apenas a Câmara que o apóia e para a qual continua repassando os recursos para pagar o salário de R$ 800 (oito salários mínimos) a cada um dos vereadores.
O delegado de polícia, Cícero Benício Gomes de Lima, 42, diz que foi ele quem sugeriu a criação de uma segunda Câmara.
Afirma que o objetivo era acabar com a tensão durante as reuniões semanais. As duas Câmaras funcionavam no mesmo prédio.
Assassinato
A criação das duas Câmaras foi o último lance de vários conflitos políticos envolvendo o prefeito e o grupo de Torres, que teria motivado, em abril último, o assassinato do vereador Hélio Barbosa Costa (PPR), 35, ligado a Sá. Em Água Branca, PT e PPR são coligados.
Duas pessoas foram presas pela polícia local acusadas do crime. O delegado Jobson Cabral de Santana, 33, disse que a morte de Costa foi encomendada por Torres aos pistoleiros José Alves Ramalho (Zé Anchieta) e José Alves Silva (Zezinho do Chapeuzão).
O delegado afirma que o deputado teria sido o “autor intelectual” do crime e teria pago R$ 2.000 para os dois executarem o vereador com quatro tiros.
Mas o vereador José Pedro Lima (PTB), que não foi preso, confessou publicamente o assassinato e fugiu há dois meses da cidade.

Tensão
A morte do vereador e a criação de uma segunda Câmara aumentaram a tensão nessa cidade do sertão alagoano. Os dez vereadores e o prefeito andam armados, acompanhados por seguranças.
O secretário estadual de Segurança, Antônio Amaral, reforçou o policiamento no município, que tinha quatro policiais. Hoje são 20.
Durante 30 anos, a família Torres dominou politicamente Água Branca. O prefeito Sá era antigo aliado da família, mas rompeu na última eleição para se candidatar.
Ele conseguiu se filiar ao PT local e disputou a eleição municipal contra Isabel, filha de Roberto Torres, derrotando-a. Sá pretendia indicar Costa como seu sucessor para disputar a eleição municipal de 1996 na cidade.
Torres nega o envolvimento no crime. “Eu não tinha interesse na morte do vereador Costa, sou da paz”, disse.
Ele se recusou a depor no inquérito sobre o caso, segundo o delegado Santana. “Só falo na Justiça”, afirmou Torres. Mas isso não impediu que fosse indiciado.
Até o ano passado, Roberto Torres era deputado federal. Ele foi o vice-presidente da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Pistolagem, criada pela Câmara Federal. A CPI investigou a violência promovida por matadores de aluguel no país.
Como deputado, tem imunidade parlamentar (instrumento legal que impede que um parlamentar seja processado) sem licença dos colegas. Para ser processado, a Assembléia Legislativa tem de autorizar a perda da imunidade.
Na legislatura passada, foram apresentados 19 pedidos para processar deputados em Alagoas, mas nenhum nunca chegou a ser votado pelos 27 deputados estaduais.
Com medo de novas represálias de adversários, Sá disse a assessores ouvidos pela Agência Folha que está deixando o PT.
Sá e seus aliados contam que vêm sendo ameaçados de morte. “É difícil ser prefeito do PT no sertão”, declarou o prefeito.
Segundo ele, as oligarquias nordestinas (grupos mantidos por uma mesma família e partido) discriminam as lideranças petistas.
“Nós admitimos que fosse um prefeito do PT, desde que fosse um prefeito justo”, afirmou José Paulo Santos (PTB), 34, presidente da Câmara ligada a Torres.

Canapi
Água Branca vive hoje uma situação parecida com a de Canapi, também em Alagoas, quando Fernando Collor era presidente.
Lá os Malta, família da ex-primeira-dama Rosane Malta Collor de Mello, espalharam pânico entre os moradores e adversários antes e depois de perderem as eleições municipais.

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