São Paulo, domingo, 2 de julho de 1995
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Melancolia aguda bloqueia ato criativo

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

O psiquiatra Taki Cordás, 37, coordenador do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do HC (Hospital das Clínicas), em São Paulo, acredita que o tipo de trabalho realizado na Inglaterra pelo psiquiatra Oliver James apenas alimenta os mitos românticos sobre os artistas.
Cordás acaba de voltar de um congresso nos EUA, onde um dos assuntos mais presentes foi a ligação possível entre a criatividade e loucura. Uma tema que não é novo passa agora a ser estudado longe de todas as superstições ou lugares-comuns que sempre acompanharam o assunto.
Segundo ele, esse é um tema acadêmico emergente nas discussões e encontros de membros das ciências médicas. Um dos objetos abordados em sua tese de doutorado foi o antidepressivo Prozac.
Sobre o uso do medicamento em larga escala e a possibilidade de que seu efeito possa alterar a qualidade de uma obra de arte, Cordás não aceita qualquer tipo de ligação.
``Acredito que as pessoas vêem com um certo charme um distúrbio como a depressão. Mas isso não está ligado à criatividade. Artistas quando se encontram sob estados agudos de melancolia, por exemplo, ficam impedidos de executar o ato da criação. A atividade artística é também um ato de trabalho. O artista pode se utilizar da doença em seus trabalhos. Mas a crise é sempre paralisante", diz.
Para comprovar sua tese de que a depressão, um dos distúrbios mais comuns, é de fato uma barreira que impede a execução de um projeto artístico, cita como exemplo o caso do bailarino russo Vaclav Nijinski.
Nijinski, em seus longos períodos de depressão, não conseguia realizar qualquer tipo de trabalho, terminando por morrer internado em um hospício. Um caso que se confronta com o ideal do artista enlouquecido mas, ainda, capaz de uma fantástica produção.
Uma das atividades de Cordás no HC está ligada aos distúrbios alimentares em bailarinas. Doenças como bulimia ou anorexia, relacionadas aos distúrbios de apetite, são comuns entre pessoas que realizam essa arte.
Cordás afirma que 7,5% das bailarinas canadenses sofrem de algum tipo de mal relacionado à alimentação, o que sempre acaba resultando em crises depressivas.
O Brasil ainda não possui estatísticas a respeito. No país, ainda segundo ele, o índice também é relevante.
Taki Cordás credita isso ao fato de que esse grupo de artistas, os bailarinos, tendem a associar magreza à leveza, essa última essencial à profissão.
Mas, quando em tratamento, seus desempenhos sempre melhoram quando se vêem livres da doença. Ainda que sejam tratadas com um antidepressivo como o Prozac.
(MR)

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