São Paulo, quarta-feira, 19 de julho de 1995
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Itamar critica comando do Plano Real por FHC

MARTA SALOMON; JAIR RATTNER
ENVIADA ESPECIAL A LISBOA

JAIR RATTNER
O ex-presidente Itamar Franco criticou ontem a política de juros altos, a desindexação dos salários e o programa de privatização do governo Fernando Henrique.
"Juros altos levam à recessão", afirmou o embaixador brasileiro em Portugal. Ele determinou que a conversa fosse "informal" (não foi gravada e as anotações foram feitas posteriormente).
FHC chega hoje em Lisboa para uma visita oficial de quatro dias.
Desde de que assumiu a embaixada brasileira em Portugal, há um mês e meio, Itamar tem preferido se manter distante da política interna brasileira.
"Agora sou um homem da planície e posso me dar ao luxo de não interferir mais". Por isso, ele não daria "conselhos" ao presidente durante a visita. Mas manifestou as primeiras críticas à administração do Plano Real desde que passou o cargo a FHC.
Perguntado se acabaria com a correção automática dos salários pela inflação, como fez FHC, Itamar disse que evitaria tomar essa decisão se fosse presidente.
"Medidas como essa geram reações em cadeia e criam núcleos de resistência na sociedade: as consequências são imprevisíveis".
Itamar afirmou que, enquanto esteve no Palácio do Planalto, impôs uma política de juros baixos.
"Não sei como os juros altos podem ajudar a manter a estabilidade da economia", disse. "Durante o meu governo, o país voltou a crescer".
Itamar rebateu críticas feitas a medidas adotadas no seu governo pelo então ministro da Fazenda, Ciro Gomes. "Se ele (Ciro) não tivesse aceito o convite naquele sábado (da demissão do ministro Rubens Ricupero), o candidato Fernando Henrique não seria hoje o presidente da República", afirmou.
Em meio a elogios ao ex-ministro ("moço formidável"), Itamar disse que Ciro tem grandes chances de se eleger presidente, caso venha a se candidatar.
Se dependesse de Itamar, FHC poderia esquecer qualquer possibilidade de se reeleger em 1998. "Sou contra a reeleição", disse.
No debate econômico, Itamar também tomou partido. "Sou mais o Ciro", insistiu, referindo-se aos ataques do ministro do Planejamento, José Serra, à abertura das importações adotada por Ciro.
Itamar defendeu o acordo do Mercosul (de livre comércio entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), negociado em seu governo. "Estava tudo correto, inclusive o fato de não fixar restrições à importação de carros argentinos."
O embaixador deixou claro que não aceita críticas do atual governo por mais um motivo: "Nada foi feito sem o conhecimento prévio do candidato Fernando Henrique."
Preocupado durante toda a conversa em não interferir em assuntos internos do Brasil, o embaixador fez questão, porém, de sair em campanha contra a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, prevista pelo governo FHC.
Itamar não quis comentar a influência que o PFL tem no atual governo. "Todos sabem que eu preferia o mineiro Hélio Garcia (ex-governador de Minas Gerais) no lugar de vice de Fernando Henrique", esquivou-se.
Sobre o seu futuro político, insistiu que não disputará mais qualquer cargo público. "Encerro aqui a minha contribuição para o país."
Minutos depois, ele defendeu a proposta de os ex-presidentes ocuparem automaticamente uma cadeira no Senado, após o mandato.

Planalto responde
O porta-voz da Presidência, Sérgio Amaral, disse ontem que a grande maioria das opiniões atribuídas a Itamar ``são conhecidas".
Amaral disse que FHC precisava conhecer a íntegra das declarações e ver o contexto para avaliar a necessidade de se pronunciar.
Ontem, às 16h, FHC foi informado por sua assessoria sobre as críticas de Itamar à sua política econômica. Questionado em seguida se isso o deixaria chateado com Itamar, Fernando Henrique respondeu: ``Imagina...".

Colaborou a Sucursal de Brasília

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