São Paulo, quarta-feira, 19 de julho de 1995
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Manipulação das notícias

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Não tenho elementos e mesmo que os tivesse não iria comentar a substituição do diretor de jornalismo da TV Globo. É problema que diz respeito à emissora e aos interessados e não tenho por que perder tempo com o assunto. Mas escapou um pormenor que tem a ver com todos nós, nação e povo.
Ficamos sabendo o que mais ou menos sabíamos: o presidente da República falava todos os dias com o editor do ``Jornal Nacional". A impressão que nos sobra é óbvia: o presidente não apenas sabia antecipadamente o que ia para o ar, como, em certo sentido, sugeria ou vetava matérias.
Parece que, no dia em que foi surpreendido por uma notícia (aliás, sem importância), a mesa virou e as águas rolaram. A emissora tem o direito líquido e certo de agir como quiser. No passado, substituiu o editor do mesmo noticiário por conta de uma complicada montagem do último debate presidencial de 1989. O autor da façanha caiu nas graças do então presidente Collor e assumiu o posto até que, por qualquer problema de comunicação com o atual presidente, acabou sendo demitido.
Não se pode criticar a Globo por agir dentro das normas da livre empresa. Tampouco se pode criticar o ex-diretor que procurou acesso às fontes -o que é trivial na profissão.
O que se deve criticar é o próprio presidente da República. Ele não tem tempo para atender a ministros, comissões e reclamações como a dos agricultores que estão em caravana pelas estradas a fim de chamarem a atenção do governo.
Sabe-se que o presidente não gasta tempo apenas com o diretor do telejornalismo da TV Globo. Ele deve a sua carreira política à habilidade com que sabe manejar parte da mídia que se deslumbra com o poder. Sugerindo, vetando ou facilitando notícias, o presidente que dificulta ou recusa audiências a ministros, trabalhadores e empresários está sempre disponível a manipular o noticiário a favor de seu grupo e de seus interesses.

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