São Paulo, quarta-feira, 2 de agosto de 1995
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"In medio virtus"

Nem revanchismo, nem necrofilia. Mas nada de omissão.
O projeto que reconhece a morte dos 136 desaparecidos no regime militar, elaborado pelo chefe de gabinete do Ministério da Justiça, José Gregori, tem o mérito de colocar uma importante demanda histórica em seus devidos termos.
Apesar das suscetibilidades envolvidas no assunto, o governo não cede à tentação da tibieza, deixando claro que a Lei de Anistia de 1979, evocada por alguns militares, não contempla esses casos. Neutraliza assim as pressões dos que desejariam ver esse assunto definitivamente esquecido.
Ao tornar possível a indenização das famílias dos mortos, o projeto permite oferecer a elas uma justa reparação que, longe de eliminar a dor que experimentaram no passado, reconhece claramente a responsabilidade do Estado por um ilícito ocorrido em sua esfera, criando um precedente de lisura e transparência oficial no trato das questões relativas à violência civil.
Por outro lado, ao excluir militantes de esquerda mortos em combate, o projeto, contra as pressões dos que não se vêem contemplados pela iniciativa, explicita que nem todas as mortes ocorridas no período autoritário estavam revestidas de arbitrariedade ou ilegalidade. Muitas delas antes resultaram dos riscos a que estão naturalmente expostas todas as partes de um confronto armado.
Por fim, o projeto não prevê uma investigação das circunstâncias sob as quais se deram as mortes. Evita-se assim que se iniciem investigações cujas chances de sucesso dependeriam de um sem-número de diligências, bem como de depoimentos e provas aos quais hoje não se teria mais acesso.
Seu grande mérito é assim contornar com objetividade os ânimos para uma desforra ideológica e ao mesmo tempo trazer para o Estado a responsabilidade por excessos execráveis cujo desagravo não pode mais hoje ser adiado. Os erros perpetrados no passado precisam ser inscritos na história, para que não se repitam.

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