São Paulo, sábado, 5 de agosto de 1995
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Heroísmo tem espaço na arte

KATIA CANTON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Essa história de heróis já é antiga no reino das artes plásticas. Desde o Renascimento, quando o homem espantou a religião do centro da arte, a pintura ocidental ficou povoada de deuses da mitológica greco-romana, encarnações de heróis do Olimpo.
Essa obsessão pelos heróis foi sempre reinventada no tempo. Nos anos 60, a arte pop fez uma tradução da mitologia, colocando seus heróis à imagem dos stars de Hollywood e figuras da vida pública norte-americana.
Andy Warhol, o protótipo do artista-tiete, soube como ninguém mitificar o lado heróico da fama. Suas estampas serigráficas de Elvis Presley, Marilyn Monroe, Elizabeth Taylor e Jackie Kennedy conferiram a esses personagens uma inconfundível aura heróica.
Hoje, depois do abstracionismo e do minimalismo, a arte volta ao glamour escancarado do heroísmo. Só que com um tom de bem-humorado narcisismo.
Nos anos 90, o herói é o espelho do artista, isto é, o próprio. Norte-americanos como Jeff Koons, Cindy Sherman e Barbara Kruger retiram de suas vidas inspiração para a ``arte heróica".
Sherman posa para suas próprias fotografias, incorporando estrelas de cinema B, personagens da história da arte.
Mas é Koons o maior exemplo do auto-herói da arte. Irreverente, irônico, genial, transformou-se na maior propaganda dele mesmo. A foto de publicidade para suas exposições mostra o próprio artista, fazendo poses de galã, de ricaço, de garanhão. Trata-se de pilantragem calculada. Sem falar que construiu um monumento a ele mesmo, em que seu busto ``brota" de cristais falsos.
Barbara Kruger dá voz heróica a clichês femininos. Retira, de revistas, imagens da mulher-comum, e sobrepõe a elas frases fortes, imperativas, assustadoras. Como ``You transform prowess into pose" (você transforma habilidade em pose). Suas mulheres são transformadas em heroínas de uma guerra contra a exploração sexual.
No Brasil, desde o início dos anos 80, nossa arte heróica ficou registrada nos muros paulistanos com a personagem da ``rainha do frango assado", criada por Alex Valaury. Foi também nos muros que Roberta Fortunato e Dora Longo Bahia esboçaram suas primeiras heroínas.
Dora levou o projeto aos limites da tragédia. Em sua última exposição mostrou seis mulheres suicidas, congeladas para a eternidade em seus atos heróicos de punição por amor. Haveria algo mais heróico do que isso?

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