São Paulo, sábado, 26 de agosto de 1995
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Cultura da irresponsabilidade

ARLINDO CHINAGLIA

O que se atribui como violência das torcidas diz respeito, na verdade, a grupos de torcedores, ligados ou não às torcidas organizadas. Daí a impossibilidade de generalizar a questão, na forma como colocada, posto que a maior parte dos torcedores vai pacificamente aos estádios.
Vale lembrar, também, que a violência não se origina do esporte. No máximo, em um dado momento de tensões, explodem paixões em palavras e/ou atos que fogem do cotidiano, mas dentro de limites toleráveis.
Portanto, as causas da violência no esporte devem ser buscadas na sociedade, o que não é o objeto deste artigo, embora se saiba que uma das causas da violência é a exclusão social. O desemprego, a falta de escola, de moradia, de cultura, de lazer etc.
Tudo isso gera situações de frustração e de impotência, tendo como consequência a falta de perspectiva de vida e a desesperança presentes, inclusive, em nossa juventude.
E, além das múltiplas causas de violência, há a impunidade, que a estimula e reforça. O exemplo vem de cima, das autoridades maiores e de todos os poderes, perpassando todas as estruturas inferiores e a institucionalizando.
Os poderosos, os grandes grupos econômicos, fazem das suas, em prejuízo de todos, sem se preocuparem e sem que as autoridades constituídas tomem alguma providência. Veja-se o caso do Banco Econômico, por exemplo.
No caso específico do esporte, muitos dirigentes de futebol, nas federações e nos clubes, não contam com o respeito dos profissionais do esporte, da imprensa e do conjunto da sociedade. As razões são conhecidas: a evasão de rendas, as disputas por publicidade, os interesses mesquinhos e pessoais se sobrepondo aos interesses do esporte.
É o que gera campeonatos com tabelas e critérios os mais esdrúxulos possíveis, sem nenhuma lógica, a não ser aquela do interesse dos ``cartolas".
Esse conjunto de situações demonstra à saciedade que os clubes não têm respeito pelo torcedor, pelo cidadão comum. Por isso, não surpreende, mas causa indignação, o fato de os clubes não terem iniciativa para proteger os torcedores que, literalmente, pagam o pato.
São eles responsáveis pela não-numeração das arquibancadas, pela venda de ingressos acima da capacidade dos estádios, pelo calendário sem planejamento, entre outras coisas que levam ao descontentamento e à desilusão de que encontremos uma solução para os problemas do futebol e do esporte.
Portanto, têm responsabilidade os dirigentes dos clubes de futebol quando acontecem fatos como o de domingo passado no Pacaembu, não pelos atos individuais e criminosos deste ou daquele torcedor, mas sim pelas mazelas e negligências no trato do esporte. O futebol, alegria de um povo, não pode ser tratado como uma coisa particular, privada, só deles.

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