São Paulo, domingo, 27 de agosto de 1995
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Há risco de extermínio, afirma antropóloga

MARIO CESAR CARVALHO
DO ENVIADO ESPECIAL

A antropóloga Mari Baiocchi, 61, é considerada uma kalunga pelos kalungas. Chegou à região em 82, demorou seis anos para conhecê-la e escreve um livro sobre o remanescente de quilombo.
Sua atividade não é apenas teórica. Foi a principal ativista para o tombamento da área. Dirige na Universidade Federal de Goiás o projeto ``Kalunga - Povo da Terra", que desenvolve pesquisas na áreas de saúde, educação, direito agrário e história do quilombo.
Em entrevista a Folha, disse que a cultura kalunga ainda corre o risco de extermínio.
(MCC)

Folha - Por que o território kalunga teve de ser tombado?
Mari Baiocchi - Porque havia e ainda há risco de desaparecimento de uma cultura por causa da grilagem de terra. As pessoas compram terras em Goiás sem saber que há negros que vivem lá há 250 anos. Grileiros diziam que iam trazer trator, a bonança. Eles colocavam o dedo em um papel sem saber o que era e entregavam a terra.
Folha - Não há risco de eles virarem peça de museu?
Baiocchi - Isso não acontecerá porque a lei prevê que cabe aos kalungas a gerência de suas terras. A terra é sagrada para os kalungas, é onde seus ancestrais são divinizados. Os ancestrais são a ligação dos kalungas com a África. A saída dali seria uma catástrofe.
Folha - Os kalungas querem postos de saúde, escola agrícola e saneamento. Isso não pode descaracterizá-los?
Baiocchi - Não, é o desejo deles. Eles querem entender a nossa fala, ler jornal, querem saúde.
Folha - Atender tudo o que pedem não seria paternalismo?
Baiocchi - Não. Eles são cidadãos como qualquer brasileiro. Se forem tratados com o paternalismo com que o governo tratou os índios, a identidade deles pode se perder. Eles têm um modo de vida que propicia a reprodução de valores éticos. É o que faz com que sobrevivam em área tão inóspita.

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