São Paulo, domingo, 27 de agosto de 1995
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O problema da cobrança do resíduo

WALDIR DE ARRUDA MIRANDA CARNEIRO

O resíduo inflacionário, que pode ocorrer nos contratos de execução sucessiva ou diferida, consiste na diferença entre prestações pecuniárias estabelecidas contratualmente como reajustáveis em periodicidade menor que a anual e os valores dessas mesmas prestações pagos sem a incidência dos referidos reajustes, por força das normas do Plano Real.
Após a edição da segunda fase do Plano Real, surgiram diversas indagações acerca da cobrança do chamado resíduo inflacionário diante do disposto no parágrafo 3º do artigo 2º da MP (medida provisória) 1.053, de 30/6/95.
Segundo esse dispositivo, salvo as obrigações em cruzeiros reais, contraídas antes de 15/3/94 e não convertidas em URV (exceção constante do parágrafo 7º do art. 28 da lei nº 9.069, de 29/6/95, bem como no parágrafo 7º do art. 28 da MP 542, de 30/6/94), são nulos de pleno direito quaisquer expedientes que, na apuração do índice de reajustes, produzam efeitos financeiros equivalentes aos de reajustes de periodicidade inferior a anual (parágrafo 3º do art. 2º da MP 1.053, de 30/6/95 -reproduzido na MP 1.079, de 28/7/95).
Observe-se, por oportuno, que esses expedientes fraudatórios do Plano Real já eram considerados nulos desde a MP 434, de 27/2/94 (cfr. art. 11, caput e parágrafo 1º), sendo que o parágrafo 3º do art. 2º da MP 1.053, de 30/6/95 (e MP 1.079, de 28/7/95), só veio dar continuidade ao tratamento normativo anterior.
No rol dessa nulidade, encontram-se as cláusulas que obrigam ao pagamento do tal resíduo inflacionário, que, em essência, não passa de uma manobra contratual para escapar à limitação de reajustamentos imposta pelo plano.
Por esse expediente, as obrigações pecuniárias são efetivamente reajustadas em periodicidade menor que a anual.
A diferença é que o resíduo produzido só se torna exigível após o transcurso de um ano.
No que tange às obrigações em cruzeiros reais contraídas antes de 15/3/94 (momento a partir do qual se tornou obrigatória a contratação em URV -art. 10 da MP 434, de 27/2/94), não há dúvidas sobre a possibilidade de cobrança do resíduo, pois, além de se tratar de direito adquirido, há dispositivo expresso a respeito (parágrafo 7º do art. 28 da lei nº 9.069, de 29/6/95, e MP 542, de 30/6/94).
Contudo, para as obrigações contratadas a partir de 15/3/94, bem como para as contratadas antes dessa data, mas posteriormente convertidas em URV (Unidade Real de Valor), não são válidas as estipulações contratuais que atualizem obrigações pecuniárias em periodicidade inferior à anual ou que produzam efeito financeiro equivalente.
Por isso, quem, por exemplo, contratou promessa de aquisição de imóvel após 15/3/94 e vem pagando prestações reajustáveis mensalmente, ou pagou esses reajustes sob forma de resíduo, pode requerer judicialmente a devolução dos valores pagos a mais.
A atenção quanto à eventual cobrança do resíduo indevido é de boa cautela, pois sempre haverá quem pretenda, ao contrário e em detrimento de todos os demais destinatários do Plano Real, manter seus recebimentos reajustados em periodicidade inferior à anual (ou obter o produto desse reajuste por outros expedientes), não obstante a clareza das disposições legais em vigor, cujo acatamento é resultado do ideal comum de endireitar os rumos do país e tem demandado enorme sacrifício de toda a sociedade.
O privilégio não só é ilegal como injustificável.

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