São Paulo, domingo, 27 de agosto de 1995
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Em defesa da mulher

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - Em ``O Segundo Sexo", Simone de Beauvoir anotou: ``Foi pelo trabalho que a mulher transpôs, em grande parte, a distância que a separava do macho. É só o trabalho que pode garantir-lhe uma liberdade concreta".
As mulheres passaram os últimos anos reivindicando igualdade social e econômica em relação ao homem. À custa de muito suor, avançou-se muito desde as primeiras fogueiras de sutiãs.
Surge agora uma proposta que, a pretexto de aumentar-lhes a vitalidade política, acaba por aniquilar o discurso das mulheres. Falo da idéia de criação de cotas femininas às listas de candidatos a cargos eletivos.
Em projeto que tramita no Congresso, a deputada Marta Suplicy (PT-SP) propõe que os partidos reservem 30% de suas candidaturas para mulheres. A deputada crê que seja essa a melhor forma de aumentar a presença feminina no Parlamento.
Marta conta com o apoio de toda a bancada de saia. Também a primeira dama Ruth Cardoso defende a idéia, de resto aprovada em recente reunião de parlamentares sul-americanas.
Depois de gastarem saliva para provar que teriam desempenho igual ou superior ao do homem as mulheres parecem conspirar contra a própria causa. Súbito, investem na tese de que são inferiores.
Ao fixar em 30% a cota de participação das mulheres o projeto de Marta termina por estimular a idéia de que os homens são 70% superiores. As mulheres mereciam mais respeito.
Eternas defensoras da igualdade de oportunidades, as mulheres propõem agora um autoprivilégio. Por que não uma cota para os índios, outra para os negros e uma terceira para orientais?
Se adotada, a regra pode gerar o pretendido aumento do número de saias com assento no Congresso. Mas não garantirá o crescimento da cota de inteligência feminina sob os arcos e pilastras do prédio de Niemeyer. Aposta-se na quantidade em detrimento da qualidade.
Em setembro, a proposta será levada à Conferência Mundial da Mulher, na China. Será exposta diante de 40 mil pessoas. É pena que se tenha escolhido momento tão solene para pisotear as sábias palavras de Simone de Beauvoir.

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