São Paulo, quarta-feira, 6 de setembro de 1995
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Televisões de Quércia estão em nome de terceiros

ELVIRA LOBATO
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-governador de São Paulo Orestes Quércia é proprietário de fato de seis emissoras de radiodifusão: duas TVs e quatro rádios, todas no Estado de São Paulo.
Só três rádios (a metade da rede) estão registradas em seu nome: Central AM e Central FM, de Campinas, e Central FM, da cidade de São Paulo.
As duas emissoras de televisão -Princesa D'Oeste, de Campinas, e TV do Povo, de Santos, ambas afiliadas do SBT- e a rádio Robatos, de Sorocaba, figuram em nome de terceiros no cadastro do Ministério das Comunicações.
Quércia confirmou à Folha, por intermédio de sua assessoria, ser o proprietário das duas TVs e da rádio em Sorocaba.
Ele disse que a TV de Campinas já está em seu nome e que a rádio de Sorocaba e a TV de Santos estão em fase de transferência.
A informação do ex-governador não coincide com a do cadastro do Ministério das Comunicações, no qual a TV Princesa D'Oeste, de Campinas, continua registrada em nome de Orlando Negrão, Paulo Machado Campos Filho, José Blota Junior e Amira Negrão.
A Folha apurou, no ministério, que tampouco existe processo oficial em curso para transferência da TV do Povo e da Rádio Robatos para o nome do ex-governador.
A TV do Povo não pode, legalmente, ser transferida para Orestes Quércia antes de novembro deste ano, porque a emissora só obteve autorização de funcionamento do governo em novembro de 91. A legislação só autoriza a transferência após cinco anos da licença.
O caso da rádio de Sorocaba é ainda mais complicado. A emissora está registrada em nome de Walter Fontoura, diretor da sucursal do jornal "O Globo", em São Paulo, e de Carlos Alberto Ramos.
Ramos já morreu, e suas ações na emissora integram o espólio. A transferência para Quércia depende da conclusão do inventário.
Além das quatro rádios e das duas emissoras de televisão, Orestes Quércia controla os jornais "Diário Popular", de São Paulo, e "Diário do Povo", de Campinas.
Orestes Quércia diz que comprou todas as rádios e TVs que possui e que nunca recebeu concessão do governo. Diz, também, que nunca usou sua rede de comunicação para ascender na política.
Embora negue ter recebido concessão do governo, há indícios de que a da TV do Povo lhe foi dada pelo governo José Sarney, em retribuição ao seu empenho para prorrogar o mandato do presidente para cinco anos.
A TV do Povo foi registrada, originalmente, em nome de Otávio Ceccato (ex-secretário da Indústria e Comércio e ex-presidente Banespa no governo Quércia) e de José Machado de Campos Filho, também ex-presidente do Banespa.
Em setembro de 1988, quando Ceccato estava para ser indiciado pela Polícia Federal, em função do escândalo Banespa -compra de títulos da Prefeitura de SP, efetuada pelo banco, que beneficiou uma empresa fantasma do Rio-, foi providenciada uma mudança dos sócios da TV do Povo, na Junta Comercial.
Saíram Ceccato e Campos Filho e entraram Francisco Santa Rita e Edson Higo do Prado, jornalistas responsáveis pelas produções de vídeo das campanhas eleitorais de Quércia, desde a eleição para governador, em 1986.
Depois da mudança do quadro societário, a empresa ganhou a concessão de TV para a cidade de Santos e os dois jornalistas transferiram a empresa para Orestes Quércia, antes mesmo de instalar a emissora.
O Código Nacional de Telecomunicações (lei 4.117/62) proíbe a transferência direta ou indireta do controle de rádios e TVs, sem a prévia autorização do governo.
Uma legislação posterior -decreto-lei 236/67, que tem força de lei- prevê o cancelamento das concessões para os casos de transferência de controle sem anuência prévia do governo.
Para contornar a situação, Quércia assinou contratos particulares de promessa de compra da TV Princesa d'Oeste, da TV do Povo e da Rádio Robatos.
Os sócios de direito assinaram ainda procurações -instrumento permitido pela legislação- delegando a responsabilidade pela administração das empresas a executivos indicados pelo comprador.
Orestes Quércia não é o único político nesta situação. Em recente entrevista à Folha, o deputado federal Jorge Maluly Neto (PFL-SP) afirmou que é quase impossível saber o número exato de emissoras pertencentes a políticos.
Segundo ele, muitos aparecem oficialmente como proprietários, mas não são donos de fato, porque entraram como sócios das empresas apenas para agilizar a concessão. Outros, disse o deputado, não aparecem como sócios mas têm o controle efetivo, por meio de contratos particulares de promessa de compra e de procurações.

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