São Paulo, quarta-feira, 6 de setembro de 1995
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Entre pensar e propor

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Insatisfeito com o governo? Console-se. A oposição não está lá muito melhor, não.
O exemplo definitivo vem da avaliação que Roberto Felício, presidente da Apeoesp (Associação dos Professores do Estado de São Paulo), fez sobre as propostas do governo para o ensino básico.
Felício queixa-se de que os R$ 12 bilhões anunciados são "muito pouco". E acrescenta: "Acho que poderíamos pensar em R$ 40 bilhões". Claro que poderíamos. Poderíamos também pensar em R$ 80 bilhões, por que não? Ou R$ 100 bilhões, quem sabe.
Só faltou dizer de onde virá essa dinherama toda. O governo, desta vez, disse como será constituído o fundo para a educação básica e atacou os pontos certos: descentralização, valorização do professor e, claro, prioridade para o ensino fundamental.
A proposta tem, de longe, muito mais qualidades do que defeitos. Mas tudo o que se ouve de uma entidade do setor é um chute qualquer sobre a quantia de recursos necessária. Assim, não se vai mesmo a lugar algum.
Passe-se para o desemprego. A CUT anuncia uma mobilização para o fim do mês. Vai haver a disputa de sempre em torno do número de presentes. O governo achará que foram poucos, a oposição dirá que foi uma massa enorme. Aí a manifestação acaba, e o desemprego continua exatamente do mesmo tamanho que estava (ou será ainda maior).
É óbvio que ninguém é a favor do desemprego. O problema é que o mundo todo está mergulhado em uma baita crise de emprego, e soluções, mesmo, surgem poucas.
Nada contra que se façam quantas manifestações se queira contra ou a favor do governo. Mas não adianta transformar tais atos em um fim em si mesmo. Se o movimento sindical sabe como lidar com o desemprego que apresente propostas ao governo e à sociedade. Mas não adianta vir com um "poderíamos pensar" em atingir em um mês o pleno emprego ou reduzir, imediatamente, o desemprego à metade. É demagogia.
Ser contra o governo é um direito sagrado. Mas não basta. É preciso ser também a favor de alguma coisa e mostrar que é possível chegar a ela, sem o voluntarismo inócuo do "poderíamos pensar" da Apeoesp.

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