São Paulo, quarta-feira, 6 de setembro de 1995
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O caso Avólio

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - O pai do coronel Armando Avólio Filho, que salvo erro ou omissão deve se chamar Armando Avólio, estranha que a seu rebento seja dispensado tratamento diverso ao que foi dado, entre outros, a Fernando Henrique Cardoso e ao Gabeira, por sinal também Fernando.
Avólio-pai acha que Avólio-filho foi anistiado de cambulhada com aqueles que, do outro lado da briga, também cometeram crimes políticos. Arrolar o presidente da República entre os criminosos é mais do que exagero: é besteira mesmo. O então sociólogo foi cassado porque, como muitos outros, jogava politicamente em um lado que parecia predestinado a ocupar o poder em tempo relativamente breve. A mesa estava posta para a esquerda de salão daquela época.
Se FHC cometeu algum crime, foi o da afobação ideológica. Quando, anos mais tarde, encontrou seu leito natural, chegaria mole ao poder que sempre ambicionou. Convenhamos, nem merecia ter sido cassado ou louvado por isso -é a carreira, o osso do ofício de quem chegar lá.
Gabeira participou de um sequestro. Mas o próprio sequestrado, o embaixador Elbrick, dos Estados Unidos, sentiu-se obrigado a elogiar o tratamento recebido de seus sequestradores. Foi a tônica do movimento de contestação ao regime militar: houve violência de lado a lado e essa violência é que foi anistiada.
O caso do coronel Avólio é diferente. Ele foi acusado por quem de direito (o grupo Tortura Nunca Mais) de ter praticado torturas. Para se entender o equívoco de Avólio-pai, faço uma escala: os exemplos citados por ele (Fernando Henrique e Gabeira) foram diferentes no grau. O professor combateu o regime militar no plano intelectual e moral. O jornalista fez a mesma coisa, mas, em dado momento, optou por aumentar o seu grau de participação na luta ideológica e se associou a um grupo de sequestradores. Quanto ao Avólio-filho, a diferença não é apenas de lado nem de grau: é de gênero.
Ele participou de torturas. A psicologia de um torturador nunca é ideológica. É fisiológica no nível primário que faz o homem se tornar uma besta.

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