São Paulo, sexta-feira, 15 de setembro de 1995
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O Mercosul e seus dois maridos

CLÓVIS ROSSI

BRUXELAS - A visita do presidente Fernando Henrique Cardoso a Bruxelas, capital da UE (União Européia), serviu para consolidar o namoro do Mercosul com esse conglomerado de 15 países que, tomados em conjunto, são a maior força econômica do planeta.
As duas partes trocaram incontáveis juras de amor. FHC disse, por exemplo, que a Europa é "a matriz sócio-cultural" dos países do Mercosul. E é também "parceiro fundamental, tanto no comércio como nos investimentos".
Já Manuel Marín, o espanhol que é um dos vice-presidentes da Comissão Européia, braço executivo do conglomerado, fez questão de ressaltar que "é a primeira vez que a UE fará um acordo de região para região com uma zona geográfica que não tem fronteiras físicas com a Europa".
Na cifrada linguagem diplomática, insinua-se também mais de um recado aos Estados Unidos, país que desde a Cúpula das Américas (Miami, dezembro de 94) vem tentando acelerar um acordo idêntico não apenas com os países do Mercosul, mas com as demais nações americanas, Cuba excluída.
O recado mais claro estava no texto do discurso que FHC preparou para o jantar oferecido pelo premiê belga, Jean-Luc Dehaene, e que acabou substituído por um improviso. Mas a idéia permanece:
"O Brasil encara o processo (de integração hemisférica) de forma gradual e com sentido de realismo, pois sabemos que o êxito dessa iniciativa dependerá da capacidade de agregar os esforços sub-regionais de integração existentes, como o Mercosul e o Nafta" (o bloco EUA/Canadá/México).
Em uma só frase, a explicitação das duas grandes divergências EUA/Brasil sobre a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), nome oficial da integração hemisférica:
1 - O Brasil acha que os norte-americanos estão querendo ir depressa demais. Daí, a menção ao gradualismo.
2 - O Brasil acha que os norte-americanos estão tentando atrair para a ALCA cada país isoladamente. O Itamaraty prefere uma negociação bloco a bloco, daí a menção ao Mercosul.
Pelas dúvidas, perguntei ao presidente se não havia recados velados aos EUA nas suas várias falas de ontem. "Pode ser, pode ser", confirmou.

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