São Paulo, domingo, 17 de setembro de 1995
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O filósofo e o champignon

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

Coisas estranhas acontecem na França. A começar pelos famigerados testes nucleares. Não que seja exatamente estranho um presidente direitoso, com devaneios gaullistas, como é Chirac, pretender retomar demonstrações chauvinistas de força militar.
Afinal, os alemães moram ao lado, sólidos em sua marcha econômica, já com tropas atuando em missões internacionais. Uma Alemanha forte, naturalmente, faz muita gente tremer e deixar o croissant cair no café.
Mas que o presidente, numa conjuntura como a atual, leve à frente os testes, afrontando a opinião da maioria dos franceses e uma onda de manifestações, não parece muito razoável.
Certamente o dispositivo militar e seus estrategistas terão poderio e motivos -bons para Chirac, ao menos- que justifiquem as explosões de Mururoa.
Mas que motivos serão esses, que a caixa preta da segurança nacional esconde? Ameaça de terrorismo nuclear? Medo da China? Da Rússia? Com que cenários paranóicos o governo francês -já com bombas para destruir centenas de cidades- trabalha?
Se a política vai mal na França, a filosofia não parece muito melhor. Ao menos é o que se deduz da entrevista concedida pelo erudito professor Gérard Lebrun ao Mais! passado.
Lebrun mostra-se em posição ofensiva contra o que chama de "tecnofobia", ou seja, uma crítica sistemática à ciência e à técnica que identifica em algumas correntes de pensamento.
Ora, o Greenpeace, com todas as bobagens que já fez, não é uma entidade que prega o retorno idílico ao mundo pré-moderno. É uma organização que trabalha com técnicas de ponta e estimula o desenvolvimento de tecnologias capazes de fazer, com menos riscos ambientais e humanos, o que algumas outras -talvez mais interessantes ao monstrengo industrial-militar- fazem predatoriamente.
Ou será que coisas como Tchernobil não valem nada?
Pelo visto, para Lebrun, não. Suas diferenças com o Greenpeace e sua crítica ao que chama de "tecnófobos" não são difíceis de explicar. Ele é favorável aos testes nucleares.
Mas, estranhamente, Lebrun, que critica os "tecnófobos", nesses tempos de Internet, robótica e engenharia genética, tem fobia de computadores e não dá bola para o fenômeno da rede que interliga pessoas mundialmente.
Não gosta de computadores, mas sente-se seguro com bombas estourando em Mururoa. Acha que a França precisa de mais cogumelos -nucleares- para se proteger de "gente como Saddam Husseim e Gadafi".
Pensando bem, será que a "tecnofobia" é mesmo uma questão tão importante a se pensar na França de hoje? Ou será que o Mais! enganou-se na grafia de "xenofobia"?

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