São Paulo, domingo, 17 de setembro de 1995
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Lições úteis das hiperinflações

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

Está na moda falar mal de economista. Como nenhum economista vivo veste a carapuça, parece que a profissão só tem amadores que nem se dignam a se defender.
Mas isso é errado. O final das hiperinflações, por exemplo, traz diversos pontos em comum, que se repetem no final desses episódios de crescimento tresloucado dos preços.
Houve 18 casos de hiperinflação no século 20. Antes não existiam hiperinflações, pois estas só ocorrem quando o governo pode emitir livremente todo o papel moeda que deseja.
Então, a primeira coisa que sabemos: as hiperinflações são raras. O estudo de como terminaram ajuda, ainda, a formular programas que têm se mostrado eficazes.
Outra coisa que sabemos: hiperinflações só ocorrem em momentos de crise fiscal grave que causam déficit, que é financiado por emissão de moeda. As crises são frutos de impasses políticos reais, só superáveis por grandes alianças políticas.
Segundo estudo que realizei e que está publicado na revista "Pesquisa e Planejamento Econômico", 1994, págs. 345 a 390, observam-se mais os seguintes fatos.
1. As hiperinflações não são processos lineares de aceleração dos preços; ao contrário, há fases de aceleração e desaceleração antes da escalada e caos final.
2. A taxa de câmbio real quase sempre tende a se depreciar muito antes do fim da hiperinflação e a se apreciar um tanto depois. Aqui cabe um registro: a apreciação do Real é das maiores.
Não tenho medo de afirmar que nos próximos 24 a 30 meses a taxa de câmbio real precisará sofrer uma desvalorização de, no mínimo, uns 20 pontos acima da inflação.
3. Dizia-se no Brasil que ter inflação relativamente estável na casa dos 20% mensais era coisa só nossa. Errado. Na Rússia, dos anos 20, isso também ocorreu (em 1921).
4. Após o término da hiper, o índice de preços não fica "zerado; sempre há um resquício de inflação passada para ser ajustado.
5. Na maioria dos casos, o fim da hiper trouxe uma fase de crescimento da economia, de maior ou menor ímpeto, que pode durar de dois a cinco anos.
Assim, parece que nossas autoridades se precipitaram em abortar o surto de crescimento que vínhamos tendo. A Argentina, com muito menor capacidade produtiva, teve três anos de crescimento acelerado, coisa que poderíamos ter desejado também.
Mas não se supera definitivamente a crise fiscal sem que também se encontre uma solução para as dívidas públicas: quer federal, quer dos Estados.
Esse aspecto, no Brasil, faz lembrar que o pior cego é aquele que não quer ver. O governo federal, roubando-se de sua responsabilidade constitucional, finge-se de morto quanto a este desafio.
Pior para ele. O Congresso, pressionado pelos governadores que vêem suas dívidas crescer incontrolavelmente ante a política de juros absurda e maluca do BC, irá agir.
E, se não agir, será co-responsável pela degringolada que pode ainda ocorrer mais para a frente.

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