São Paulo, domingo, 17 de setembro de 1995
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Ex-ministro condena sonegação no país

DENISE CHRISPIM MARIN
DE BUENOS AIRES

A economia informal na Argentina é considerada pelo economista Roberto Alemann, 72, como a causa do pior problema que o país hoje enfrenta -a queda na arrecadação de impostos.
Ex-ministro da Economia em dois governos -de Arturo Frondizi e do general Leopoldo Galtieri-, Alemann é considerado o formador de várias gerações de economistas liberais -inclusive o atual ministro Domingo Cavallo.
Segundo a revista semanal "Notícias", Alemann chegou a ser sondado por altos funcionários do governo de Carlos Menem, há um mês, para assumir o posto de Cavallo.
"Foi uma informação mal publicada", afirmou o ex-ministro em entrevista exclusiva à Folha. "Fui apenas consultado sobre as consequências de uma eventual renúncia de Cavallo."
Mesmo assim, o nome de Alemann é um dos mais lembrados quando reacendem os boatos sobre a saída de Cavallo do governo.
A seguir, alguns trechos da entrevista realizada na sede do jornal "Argentinisches Tageblatt" (Folha Argentina), do qual é diretor.

Folha - O economista Rudiger Dornbusch afirma que a Argentina teria que reduzir preços e salários em mais de 20%. O senhor concorda?
Roberto Alemann- A redução em 20% de preços e salários é um desatino. Mas alguns preços de serviços e salários estão baixando naturalmente e com maior evidência neste ano.
Folha - O senhor acredita que a recessão está se agravando?
Alemann- Não, agora não. A recessão surgiu como consequência da retirada de depósitos no total US$ 8,2 bilhões entre dezembro de 94 e maio deste ano.
Seu ponto mais baixo foi entre junho e julho. Em agosto, a economia começou a se recuperar.
Folha - O aumento do crédito e da liquidez bancária pode ser prejudicial ao plano econômico?
Alemann - O que o governo quer é o retorno do crédito, não a expansão. Quer voltar à situação anterior à da crise mexicana.
Nós tínhamos, em dezembro de 94, quase US$ 46 bilhões de pesos e dólares nos bancos. Agora temos algo em torno de US$ 41 bilhões. Portanto, o crédito é menor.
Folha - Qual é o problema econômico mais sério que a Argentina enfrenta hoje?
Alemann- É a sonegação de impostos. Com alta inflação, parece como legítimo não pagar os impostos. Ainda temos esse costume.
Cerca de 13 milhões de argentinos trabalham ou querem trabalhar legalmente. Desse total, apenas 5 milhões pagam o imposto de previdência. Ou seja, há 8 milhões de argentinos teoricamente desocupados, uma taxa de 60%.
Claro que nem todas essas pessoas estão desocupadas. Elas trabalham, mas não pagam nada.
Folha - Como o senhor avalia o aumento do desemprego?
Alemann - Parte do desemprego corresponde aos que não trabalham no sistema formal. Claro que há mais gente sem emprego hoje.
Folha - O combate à informalidade seria a chave para reduzir a taxa de desemprego?
Alemann- Há várias medidas necessárias, entre as quais o combate à economia informal. Outra é a volta dos depósitos e da liquidez.
Folha - A redução da parcela das empresas no imposto previdenciário deve reduzir a arrecadação. Qual sua interpretação?
Alemann- Essa redução foi adotada em 94 e gerou déficit fiscal. O governo tem que aumentar o nível de atividade, a liquidez e fazer com que mais gente pague impostos.
Folha - O senhor considera que a lei de conversibilidade (política de câmbio fixo, com um peso valendo US$ 1) é a melhor solução para a Argentina?
Alemann- Para um país que teve hiperinflação sem passar por uma guerra creio que é a política mais adequada.
Folha - O senhor considera adequada a fórmula das bandas cambiais adotada no Brasil?
Alemann - Matéria cambiária trata de conveniência ou não. O Brasil prefere um sistema gradual de bandas que, no fundo, não é muito diferente do argentino.
Tem um pouco mais de flexibilidade. E isso porque o país ainda não resolveu todos os problemas de déficit no Banco Central.
Folha - A Argentina poderia adotar um esquema semelhante?
Alemann - Não teria nenhuma necessidade.
Folha - O Brasil deve seguir a mesma receita de privatização da Argentina, que vendeu cerca de 80 empresas em cinco anos?
Alemann - Não há dúvida nenhuma. O Brasil não tem acesso a recursos suficientes para investir em infraestrutura.
Folha - O que o senhor pensa sobre a permanência do ministro Cavallo, em seu posto?
Alemann- Eu acho que ele deve continuar. Até 1999, como disseram o presidente Carlos Menem e o próprio Cavallo.

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