São Paulo, sábado, 23 de setembro de 1995
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Política conjuntural, efeitos estruturais

JORGE EDUARDO LEVI MATTOSO

A atual expansão do desemprego é resultante de políticas de efeitos estruturais e não apenas consequência de um processo recessivo conjuntural e passageiro.
Com o Plano Real, adotou-se no Brasil políticas de valorização cambial e elevadas taxas de juros, de abertura comercial açodada e sem políticas industriais, de desregulação e oposição a formas negociadas (câmaras setoriais), com preservação dos gargalos de financiamento dos setores público e privado e subordinação aos fluxos de capital internacional especulativo. Como no México e Argentina, tais políticas refletiram-se negativamente sobre a estrutura produtiva e do mercado de trabalho.
A redução da competitividade dos produtos nacionais exportados e o favorecimento das importações, em meio a um intenso processo defensivo de reestruturação das empresas, reduziu os postos de trabalho e alterou os coeficientes de emprego. Sem investimentos públicos em infra-estrutura econômica e social e com poucos investimentos privados produtivos, tal redução não foi compensada, mesmo que parcialmente, pela geração de novos empregos.
Mais recentemente, visando reverter o quadro de agravamento dos desequilíbrios externos sem mexer nas políticas causadoras desses desequilíbrios, o governo desencadeou uma nova onda recessiva que acabou por ampliar o desemprego e a precariedade do mercado de trabalho.
Nesse quadro, políticas de desregulação e flexibilização só agravariam a precarização em um mercado de trabalho já flexível, medidas parciais pouco resolveriam e a recuperação dos níveis de emprego torna-se verdadeira missão impossível.
Por um lado, seriam necessárias taxas de investimento e crescimento ainda mais elevadas. Por outro lado, mantidos os fundamentos do plano de estabilização, o crescimento econômico logo chocar-se-ia com a elevação das importações, decorrente déficit da balança comercial e ampliação dos desequilíbrios externos, reintroduzindo uma crise cambial e efeitos ainda mais deletérios sobre o mercado de trabalho.
Para reverter o quadro de desemprego e de precarização das condições de trabalho, o Brasil precisaria priorizar a produção e o emprego, constituindo seu próprio projeto de desenvolvimento.
Isso implicaria no rompimento com as atuais políticas e na revalorização do caráter sistêmico da competitividade, das políticas industrial, agrícola e agrária, na desvalorização do câmbio e redução dos juros, na recuperação da capacidade de investimento do Estado, na democratização das relações de trabalho, na reconstituição de câmaras setoriais e nacionais e na valorização da poupança interna.

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