São Paulo, domingo, 24 de setembro de 1995
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De quem é a autoridade

JANIO DE FREITAS
DE QUEM É A AUTORIDADE

O caso do coronel Avólio tomou agora uma vereda que excede a discussão sobre os alcances da anistia e sobre os reflexos, para a imagem do país, de um adido militar em Londres classificado como torturador nos tempos do Doi-Codi.
A afirmação do Exército de que a permanência do adido em Londres, ou sua volta, será decidida pelo ministro Zenildo Lucena e "será a melhor para o país, o Exército e para o coronel Avólio" põe dois problemas. O primeiro, de natureza institucional, decorre de que há três meses o presidente da República comunicou ao país o ato de exoneração do adido. O que está em questão, com a inexplicável transferência da decisão para o ministro do Exército, é a autoridade do presidente da República. Existe ou não, diante das vontades do Exército?
O outro problema é diplomático. O governo inglês acolheu a denúncia feita pela Anistia Internacional, tanto que se fez portador dela ao governo brasileiro. A permanência do adido abre o risco de uma situação ainda mais desagradável para o Brasil: a retirada do "agrement" inglês ao coronel Avólio, obrigando o governo brasileiro ao constrangimento da retirada forçada.
Explicações
Mesmo que sejam verdadeiros os temas que, na versão do governo, o ministro Luiz Felipe Lampreia abordará em Washington, um não foi citado e, apesar disso ou por isso, seria exatamente o motivo da viagem repentina. É o mau efeito, no governo americano, da explicação pública que o presidente Fernando Henrique deu para sua viagem à Europa: criar alternativa para não depender dos Estados Unidos.
Combinada a explicação com as declarações de Fernando Henrique pela integração do Mercosul no sistema econômico da União Européia, o resultado só pode ser reação de Washington. Saliências na sua órbita de influência é o que os governos americanos, e sobretudo o seu Congresso, menos admitem.
Sem controle
É compreensível que os altos magistrados desejem manter-se brasileiramente à margem de fiscalização que não seja a deles sobre eles. Mas, da compreensão dos seus desejos à aceitação dos seus argumentos, vai distância grande.
Em discurso no Ceará, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence, aponta uma suposta responsabilização só dos magistrados pela crise da Justiça, daí resultando as propostas de controle externo do Judiciário como "um remédio miraculoso".
Se funcionasse a fiscalização dos magistrados pelos próprios, que eles dizem já existir, o Judiciário não estaria na crise reconhecida por Pertence e por seus colegas. Caso funcionasse é que teríamos um milagre.

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